Dalila Teles Veras
Pretensos candidatos ao Nobel
Como fazer para publicar um livro?
Esta tem sido uma pergunta que me vem sendo feita com freqüência,
por moças e rapazes, na sua maioria já carregando o livro debaixo do
braço, pronto para entrar no prelo.
Pacientemente abro a pasta, quase
sempre com originais caprichosamente datilografados, sabendo de
antemão exatamente o que vou encontrar: longos poemas (para idéias
brevíssimas, como dizia Machado de Assis), invariavelmente falando
de decepções ou descobertas amorosas, condizentes, é claro, com a
bagagem que a pouca idade pode lhes oferecer.
Com certeza nenhum deles leu ainda
Rilke: “não escreva poesias de amor”, e olha que isso foi escrito em
1903! Cá entre nós, eu também só vim a ler Cartas a Um Jovem Poeta
muito tempo depois de cometer as mesmas atrocidades poéticas, se é
que ainda não as cometo.
Tomo fôlego e tento explicar ao jovem
candidato a escritor que antes de falar da publicação, teríamos que
falar da escrita. Indago sobre suas leituras, seus conhecimentos
literários e se ele eventualmente já submeteu o seu trabalho a algum
tipo de crítica.
Olha-me o agora já candidato ao Nobel
com um ar tão petulante que desisto do meu tom maternal e enfrento a
fera olhando-o com firmeza, na tentativa de combater tamanha
altivez. Ainda assim, resoluto, um deles disse-me que não lia outros
poetas por medo de influências; teoria, nem pensar, é muito chato.
Calo-me diante de tamanha sabedoria e, muitas vezes, desisto de meu
intento em orientar alguém que, de antemão, se concebe tão grande
gênio.
Ainda assim, procuro mostrar aos
pré-candidatos ao Prêmio Camões e ao Cervantes, algumas coisinhas
que considero fundamentais: sem ler (bem), não é possível escrever
bem; sem conhecer os que nos precederam não é possível renovar nada,
é só repetição, e ruim, do que de pior já se fez, vala comum da
frase feita e do já visto.
Outra regra mínima é estar antenado
com aquilo que se passa ao redor, movimentos, novas linguagem e,
sobretudo, o mundo em mutação. Olhar tudo com os olhos novos e
livres, como pedia Oswald.
É claro que, após esse discurso
enfadonho, raramente torno a ver esses poetas, mas, vez por outra,
tenho notícia deles através do lançamento de seus livros (?)
editados por editores (?) inescrupulosos que corrigem os inúmeros
erros de português daqueles textos (quando corrigem), arranjam um
ghost writer para uma apresentação elogiosa, convencem o próprio de
que é realmente um talento pronto para vir a público e, em suaves
prestações mensais, cobram do incauto uma edição de 500 exemplares
dos quais 50 ou 60 serão vendidos aos amigos no lançamento festivo,
e a pilha restante ficará encalhada num canto da casa do frustado
estreante que, sem conhecimento dos meandros para chegar aos
críticos ou a publicações especializadas, acaba por desistir do
ofício, agora já não tão glorioso.
Certamente esse jovem pensaria melhor
antes de levar a cabo o seu intento, se tivesse lido o que Octavio
Paz, em seu precioso livro O Arco e A Lira, disse dos poetas: “o
poeta moderno não tem lugar na sociedade porque efetivamente não é
ninguém. Isso não é uma metáfora: a poesia não existe para a
burguesia nem para as massas contemporâneas (...) Daí o poeta não
ter status social”. Aqui, é preciso que se diga que o poeta
mexicano, prêmio Nobel de Literatura, não escreveu isso como forma
de desestímulo, mas, antes, como reflexão realista para quem
desejasse abraçar tão árduo ofício.
|