João Bosco Fernandes
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A CURVA DA SERRA
Sempre que paro na curva da serra
e contemplo do alto a paisagem sem fim
que se perde em planícies e lonjuras,
até onde mais longe a vista alcança,
de repente acodem-me à lembrança
aqueles versos que diziam assim:
"Ó imigrante louro
que trazes a enxada ao ombro
e na roupa cheia de remendos
a bandeira de todas as pátrias,
sobe comigo a estes píncaros
e contempla a manhã brasileira
que vai despontando lá dentro da serra
como um punhado de cores jogado da terra" (Cassiano Ricardo)
Embalado na doce melodia,
aperto ao peito a quadra centenária
e abraço com emoção ruas antigas,
retalhos desbotados do passado...
O casario de janelas largas,
grandes sombras de "ficus", preguiçosas,
dormindo suas sestas nas calçadas...
Ah, flores murchas dos jardins da infância,
fugaz lembrança de tempos dourados
que já se foram para o nunca mais.
Atormentado,envolto em tais enleios,
procuro reviver a tua história,
porém precisaria ser cantor.
Se soubesse cantar, eu cantaria
o hino inesquecível e glorioso
de tua padroeira, a Mãe Sant'Ana.
Então espalharia pelos ventos
Os feitos e memórias gloriosas
que encheram de grandeza o teu passado.
Cantaria a epopéia de tuas lutas,
a saga e heoísmo de teus filhos,
glória de teus varões assinalados.
Depois, eu tentaria cantar com os passarinhos
que te despertam em lindas alvoradas,
bebendo o orvalho da manhã da serra.
Como não sei cantar tantos solfejos,
para espalhar teus hinos na montanha,
precisaria, então, ser um pintor.
Ah, se eu soubesse pintar, eu pintaria
o clarão ofuscante das auroras,
dessas tuas manhãs sempre douradas,
escancaradas de luz!
Eu pintaria o verde exuberante
dessas tuas montanhas onduladas
na explosão estuante da semente
explodindo da terra em profusão.
Pintaria a beleza das donzelas,
das flores belas dos jardins da serra
botões de rosas enfeitando as praças
e enfeitiçando os nossos corações.
E, ao descer a serra com emoção,
com os olhos marejados de saudade
eu fitaria, ao longe, um vulto amado
NA CURVA ONDE DEIXEI MEU CORAÇÃO!
ÉRAMOS SEIS
(Ao tio Totô - na festa de seus 90 anos)
Noventa anos de andanças,
da velhice à mocidade:
um turbilhão de lembranças,
de alegrias e esperanças,
que se tornaram saudades.
"Seu Nequim, me dê um cigarro,
que eu também sou fumadô;
uma ponta que eu trazia
caiu n'água e se molhô,
taí Dóro bem que viu,
com preguiça não apanhô"
No alvorecer feliz desta manhã,
sua família aqui se reuniu
para cantar a Deus louvores mil
neste dia de festa da Milhã!
E, por entre os festejos da alvorada,
agradecer a Deus com alegria,
estes noventa anos de jornada,
e a ternura de sua companhia.
Agradecer por estes longos anos,
com todas as lembranças que ficaram
das horas de prazer ou desenganos
e das grandes saudades que deixaram.
Agradecer o amor, sempre presente,
as lições de otimismo e de harmonia,
que ele soube espalhar, sempre contente,
enchendo as horas tristes de alegria.
e, na risonha manhã,
desses noventa anos que passaram,
cantaremos também o amor fraterno
de cinco irmãos queridos
que os fantasmas do passado já levaram.
Mas, para não chorar tanta saudade,
citando todos eles de uma vez,
vamos pedir que o tio Totô repita
uma história que ele sabe, e é tão bonita,
que começa dizendo: ÉRAMOS SEIS...
Natal, 16 de outubro de 1994.
AMOR E BONDADE
Quem ama suporta a ofensa,
Quem é bom sabe doar,
Quem ama se compadece,
Quem é bom sabe ajudar.
Quem é bom sempre sorri,
Quem ama faz maravilhas,
Quem é bom não tem medidas,
Quem ama não pensa em si.
M Ã E
É luz que vem do Céu, farol que não se apaga,
É estrela vespertina a suspirar de dor...
É amor que se oferece no altar da vida,
É vida que se doa no altar do amor...
É facho luminoso, afugentando as sombras,
É força que sustenta o bordão do pastor,
É ninho perfumado envolto nas alfombras,
É o segredo de Deus, desabrochando a flor...
É o sol dos caminheiros de longínquas plagas,
É lírio divinal a vicejar nas fragas,
É cascata de luz seu doce olhar de amor...
É nome que se escreve em tábuas de granito,
É o princípio do Ser - a matriz do Infinito,
É o sofrimento e a glória - o Calvário e o Tabor.
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