Adriana Abdenur

Adriana Abdenur - abdenur@fas.harvard.edu

Pátria

Era pequenininha. Bebia no leite de minha mãe os resquícios de sua nostalgia, e à noite, embriagada, chorava de saudades de uma terra que tampouco conhecia. Cresci fabricando números para contar a nossa distância: falava de léguas e de nós, de jardas infinitas. Vivia uma vida centrífuga em torno do teu turbilhão, fazendo de conta que meu eixo era mais que uma ilusão. Falava em voltar sem jamais ter ido, fingindo que te pertencia. Via teu rosto imprimido nos jornais da tarde, nos cartões postais, e ria: -- Vou morar lá um dia, eu dizia. Mas a vida fez-se ao meu redor, e ancorou-me no lado de fora. Vivo agora com a angústia de saber que a saudade que não se mata tampouco vai-se embora. Vejo-me de casa feita e filha no colo. Sei que lhe passo no leite sedes mais atrozes do que aquela que sacio: a vontade de relembrar um passado ainda vazio, e a saudade que nos persegue por esta vida no exílio.


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