Bocage


Pena de Talião

Ao Padre José Agostinho de Macedo
Tu nihil invita dices, faciesve Minerva. Horácio, Arte Poética, V, 385 Invidia rumpantur ut ilia Codro. Virgílio, Écloga VII (. . .) Refalsado animal, das trevas sócio, Depõe, não vistas de cordeiro a pele. Da razão, da moral o tom que arrogas, Jamais purificou teus lábios torpes, Torpes do lodaçal, donde zunindo (Nuvens de insetos vis) te sobem trovas À mente erma de idéias, nua de arte. (. . .) Sanguessuga de pútridos autores, Que vais com cobre vil remir das tendas, Enquanto palavroso impõe aos néscios E a crédulo tropel, roncando, afirmas Que resolveste o que roçaste apenas (Falo das Artes, das Ciências falo); Enquanto a estátua da Ignorância elevas, Os dias eu consumo, eu velo as noites Nos desornados, indigentes lares; Submisso aos fados meus ali componho À pesada existência honesto arrimo, Co'a mão, que Febo estende aos seus, a poucos. Ali deveres, que não tens, nem prezas, Com fraternal piedade acato, exerço; Cultivo afetos à tua alma estranhos, Dando à virtude quanto dás ao vício. Não me envilece ali de um frade o soldo, Ali me esforça ao gênio as ígneas asas Coração benfazejo, e tanto e tanto Que a ti, seu depressor, protege, acolhe; Que em redondo caráter te propaga A rapsódia servil, poema intruso, Pilhagem que fizeste em mil volumes, Atulhado armazém de alheios fardos, Onde a Monotonia os mexe, os volve, E onde teimosa Apóstrofe se esfalfa, Já co'os Céus intendendo e já co'a Terra. (. . .) Prossegue em detrair-me, em praguejar-me, Porque Délio dos prólogos te exclui: Pregoa, espalha em sátiras, em lojas Que Zoilos não mereço, e sê meu Zoilo: Chama-me de Tisífone enteado, Porque em fêmeo-belmírico falsete Não pinto os zelos, não descrevo a morte; Erra versos, e versos sentencia; Condena-me a cantar de Ulina e d'anos. Agrega o magro Elmano ao fulho Esbarra; Ignora o baquear, que é verbo antigo, Dos Sousas, dos Arrais somente usado; Metonímias, sinédoques dispensa; Dá-me as pueris antíteses, que odeio; De estafador de anáforas me encoima; Faze (entre insânias) um prodígio, faze Qual anda o caranguejo andar meus versos; Supõe-me entre barris, entre marujos (De alguns talvez teu sangue as veias honre): Mas não desmaies na sua carreira; avante, Eia, ardor, coração . . . vaidade, ao menos! As oitavas ao Gama esconde embora, Nisso não perdes tu nem perde o mundo; Mas venha o mais: epístolas, sonetos, Odes, canções, metamorfoses, tudo . . . Na frente põe teu nome, e estou vingado.

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