Leandro Gomes de Barros nasceu em 1865, na Fazenda Melancia, município
de Pombal, Estado da Paraíba. A Fazenda pertencencia aos trisavós
do autor desta nota, Manuel Xavier de Farias e sua mulher Dona Antônia
Xavier de Farias, por quem Leandro foi criado. Manuel e Antônia eram
pais do Padre Vicente Xavier de Farias, que nasceu na mesma fazenda em
1822. Ordenado sacerdote, aos 24 anos de idade mudou-se para o Teixeira
em 1846, tendo permanecido ali durante 61 anos. Faleceu em 13 de dezembro
de 1907, com 85 anos de idade. Em 1880, os pais do Pe Vicente mudaram-se
para o Teixeira, vindo em sua companhia o grande e talentoso Leandro, aos
15 anos de idade.
O Pe Vicente foi o terceiro vigário do Teixeira, como se pode ver
no Livro de Tombo abaixo transcerito:
CAPELA DE SANTA MARIA DA MAGDALENA
Fundamentos da Capela lançados em 1792. Doação do
patrimônio em 1795. Inauguração da Capela em 1809.
1º Capelão: Cônego Manoel da Costa Palmeiro, vigário
de Patos. Foi ele quem lançou os fundamentos e inaugurou a capela.
2º Capelão: Pe Antônio Dantas Correia de Góes,
falecido em Patos, no dia 12 de março de 1852. Elevação
do Teixeira à Freguesia em 06.10.1857 pela Lei Provincial nº
16. 1º Vigário: Pe José Germiniano Pereira Régis
2º Vigário: Pe Bernardo de Carvalho Andrade 3º Vigário:
Pe Vicente Xavier de Farias
No Teixeira, Leandro conviveu com violeiros da estatura de Inácio
da Catingueira, Romano da Mãe d'Água, Bernardo Nogueira,
Ungulino Nunes da Costa e Nicandro Nunes da Costa. Por eles nutriu admiração
e deles adquiriu o estro da poesia popular.
De Teixeira mudou-se para Vitória de Santo Antão e de lá
para o Recife, onde viveu na rua Motocolombó, nº 87, em Afogados.
Leandro era casado com Dona Venustiniana Aleixo de Barros, união
da qual nasceu uma única filha, Raquel de Barros Batista que se
casou com o poeta Pedro Batista (1890-1938).
Sobre Leandro, Luiz da Câmara Cascudo in Vaqueiros e Cantadores nos
dá o seguinte depoimento (pág. 264 - edições
de ouro):
"Nasceu e morreu na Paraíba, viajando pelo Nordeste. Viveu exclusivamente
de escrever versos populares inventando desafios entre cantadores, arquitetando
romances, narrando as aventuras de Antônio Silvino, comentando fatos,
fazendo sátiras. Fecundo e sempre novo, original e espirituoso,
é o responsável por 80% da glória dos cantadores atuais.
Publicou cerca de mil folhetos, tirando deles dez mil edições.
Esse inesgotável manancial correu ininterrupto enquanto Leandro
viveu. É ainda o mais lido dos escritores populares. Escreveu para
sertanejos e matutos, cantadores, cangaceiros, almocreves, comboieiro,
feirantes e vaqueiros. É lido nas feiras, nas fazendas, sob as oiticicas
nas horas do "rancho", no oitão das casas pobres, soletrado com
amor e admirado com fanatismo. Seus romances, histórias românticas
em versos, são decoradas pelos cantadores. Assim Alonso e Marina,
O Boi Misterioso, João da Cruz, Rosa e Lino de Alencar, O Príncipe
e a Fada, o satírico Cancão de Fogo, espécie de Palavras
Cínicas, de Forjaz de Sampaio, a Órfã Abandonada,
etc constituem literatura indispensável para os olhos sertanejos
do nordeste. Não sei se ele chegou a medir-se com algum cantador.
Conheci-o na capital paraibana. Baixo, grosso, de olhos claros, o bigodão
espesso, cabeça redonda, meio corcovado, risonho, contador de anedotas,
tendo a fala cantada e lenta do nortista, parecia mais um fazendeiro que
um poeta, pleno de alegria, de graça e de oportunidade.
Quando a desgraça quer vir Não manda avisar ninguém,
Não quer saber se um vai mal E nem se outro vai bem, E não
procura saber Que idade Fulano tem. Não especula se é branco,
Se é preto, rico, ou se é pobre, Se é de origem de
escravo Ou se é de linhagem nobre! É como o sol quando nasce
O que acha na terra, cobre!
Um dia, quando se fizer a colheita do folclore poético, reaparecerá
o humilde Leandro Gomes de Barros, vivendo de fazer versos, espalhando
uma onda sonora de entusiasmo e de alacridade na face triste do sertão."
O poeta João Martins de Ataíde, que comprou os direitos autorais
de Leandro a Venustiniana Eulália de Barros, escreveu o seguinte
no folheto A Pranteada Morte de Leandro Gomes de Barros:
Poeta como Leandro Inda o Brasil não criou, Por ser um dos escritores
Que mais livros registrou, Canções, não se sabe quantas,
Foram seiscentas e tantas As obras que publicou. No dia de sua morte O
céu mostrou-se azulado, No visual horizonte Um círculo subdourado
Amostrava no poente Que o poeta eminente Já havia se transportado.
Na tentativa de preservar a memória deste gênio da
poesia popular, não posso deixar de registrar o depoimento de Carlos
Drummond de Andrade, publicado no Jornal do Brasil, edição
de 9 de setembro de 1976, que escreveu o seguinte:
"Em 1913, certamente mal informados, 39 escritores, num total de 173, elegeram
por maioria relativa Olavo Bilac príncipe dos poetas brasileiros.
Atribuo o resultado a má informação porque o título,
a ser concedido, só poderia caber a Leandro Gomes de Barros, nome
desconhecido no Rio de Janeiro, local da eleição promovida
pela revista FON-FON, mas vastamente popular no Nordeste do País,
onde suas obras alcançaram divulgação jamais sonhada
pelo autor de "Ouvir Estrelas". (...) E aqui desfaço a perplexidade
que algum leitor não familiarizado com o assunto estará sentindo
ao ver defrontados os nomes de Olavo Bilac e Leandro Gomes de Barros. Um
é poeta erudito, produto da cultura urbana e burguesa média;
o outro, planta sertaneja vicejando à margem do cangaço,
da seca e da pobreza. Aquele tinha livros admirados nas rodas sociais,
e os salões o recebiam com flores. Este, espalhava seus versos em
folhetos de cordel, de papel ordinário, com xilogravuras toscas,
vendidos nas feiras a um público de alpercatas ou de pé no
chão."
E continua Drummond, sua comparação justa e inteligente:
"A poesia parnasiana de Bilac, bela e suntuosa, correspondia a uma zona
limitada de bem estar social, bebia inspiração européia
e, mesmo quando se debruçava sobre temas brasileiros, só
era captada pela elite que comandava o sistema de poder político,
econômico e mundano. A de Leandro, pobre de ritmos, isenta de lavores
musicais, sem apoio livresco, era o que tocava milhares de brasileiros
humildes, ainda mais simples que o poeta, e necessitados de ver convertida
e sublimada em canto a mesquinharia da vida (...). Não foi príncipe
de poetas do asfalto, mas foi, no julgamento do povo, rei da poesia do
sertão, e do Brasil em estado puro."
Severino Nunes de Farias, irmão mais velho do autor desta nota,
na Fazenda Mugiqui onde mora atualmente, recolheu da memória e passou
para o papel os seguintes versos inéditos de Leandro onde ele descreve
um encontro que teve com o poeta Chagas Batista na estação
de trem de Tapera:
Batista viajava De Vitória a Jaboatão, Quando chegou a Tapera,
Que saltou na estação, Encontrou-se com Leandro, Entraram
em coversação: Bom-dia, Senhor Leandro, Como vai, como passou,
Leandro não conhecia, Mas disse também bom-dia, De onde vem,
quando chegou? Para comprar cigarro Tinha saltado do trem, Disse ele: Não
vou bem, Conheces o meu ofício, Já divulgo o precipício
E o desmantelo já vem. Bom-dia, colega amado, Disse Leandro a Batista
E lhe apurando a vista, Viu-lhe o bigode raspado, Ficou muito admirado,
Com muito cuidado olhou E tomando liberdade, Disse: Raspou de verdade,
Colega, quem desfeitou? Disse-lhe Chagas: Ninguém, Raspei porque
hoje é moda, Eu que sou homem da roda, Por isso raspei também,
Só não raspa quem não tem, A moda é de quem
quiser, Pode usar ela quem quer. Então, Leandro lhe disse: Homem
sem barba é mulher, Quando eu tinha doze anos Não precisava
de estojo, Um cabra teve o arrojo De me chamar de santinho, Eu lhe disse:
Você quer Meter-se em couro de boi? Ele me disse: Perdoe,
Homem sem barba é mulher!
Leandro nasceu em 19 de novembro de 1865, no sítio Melancia, em
Pombal, e faleceu em Recife, no dia 4 de março de 1918.
In Nota nº 72 do livro GUERREIRO TOGADO, Fatos Históricos de
Alagoa do Monteiro, de autoria de Pedro Nunes Filho - E-mail: leo@elogica.com.br
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