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BANDA LUSÓFONA | PORTUGAL

Teixeira de Pascoaes | (1877-1952)

Teixeira de Pascoaes e os surrealistas em português

António Cândido Franco

A leitura da obra de Teixeira de Pascoaes (1877-1952) pelos surrealistas portugueses constitui um dos aspectos mais efusivos e exaltantes da recepção da poesia do autor de Regresso ao Paraíso. Há nela uma luz votiva, uma promessa de reaquisição, que em nenhum outro lado, no que diz respeito a Pascoaes, se encontra. Tal faceta não mereceu porém dos estudiosos qualquer atenção digna de registo. Que eu saiba não há um único estudo que tome por senda a ligação de Teixeira de Pascoaes ao surrealismo em português, ou a ignição deste naquele [salvante aqui, para maior confusão de todos, o de Osvaldo Manuel Silvestre (v. “Uma Bibliografia”)], o que, depois do muito, e do muito mau, que se tem dito sobre o Poeta do Marão, seria caso de pasmo ou de escândalo, não se soubesse há muito que só se estima no geral e no presente o que não estraga o desígnio instalado. E, quando tratamos de poesia portuguesa recente, falamos duma sessão reservada, cujos bilhetes trazem lugar marcado, ou duma prima-dona, cujo capricho não admite réplica.

Teixeira de Pascoaes tem sido lido, relido e treslido como um autor que decorre da poesia finissecular oitocentista, em particular do neogarrettismo de António Nobre e do dito neo-romantismo de Os Simples de Guerra Junqueiro. É isso que encontramos nas leituras de Régio, Gaspar Simões, Casais Monteiro, Jorge de Sena, Jacinto do Prado Coelho, Óscar Lopes, Manuel Antunes e nas de todos os outros que para nossa decepção e alguma revolta se debruçaram sobre a poesia grande de Pascoaes. Abro ao acaso um destes críticos e leio o que se segue: tal como Oliveira Martins, como Junqueiro na Pátria e como A. Nobre, [Teixeira de Pascoaes] parte de um sentimento de frustração pátria que foi agravada pelo Ultimato. A sua solução consistiu em transmudar em sentido vagamente panteísta e espiritualista a ideia do progresso geral da natureza e da humanidade que herdara da geração de 70, em elevar a apologia da saudade, já tradicional no lirismo português, às proporções de uma intuição étnica: a intuição da essência espiritual a que a humanidade tenderia, através da sua marcha histórica. (Óscar Lopes, in História da Literatura Portuguesa, 9 ª ed., 1976, 1052-3). [1]

Boa (e estrídula) malha! Mas Pascoaes, com tanto andamento, tanto braço, tanto ardil, não tem solução senão ficar amarrado ao século XIX; não se vislumbra ali, naquelas linhas, o mais pequeno raio de actualidade. Em raros momentos, e raros não sabemos se por incómodo ou se por simples falta de atenção, estes críticos olharam para as relações que a obra de Fernando Pessoa começou por ter com o saudosismo de Teixeira de Pascoaes, através dos textos publicados em 1912 na revista A Águia sobre a nova poesia portuguesa e com o aparecimento dos primeiros poemas de Alberto Caeiro, que contêm, como é sabido, em dois ou três momentos cruciais (sobretudo o poema XXVIII), [2] referências explícitas à experiência poética de Pascoaes. Ainda assim, estas pontes, que noutro caso seriam imponentes e admiráveis construções de passagem, foram tão-só bagatelório a que ninguém ligou; e quando atendeu foi mais para marcar a diferença ou a ruptura entre os dois poetas – abrindo um fosso fundo, pasme-se, entre saudosismo e modernismo – que para estabelecer afinidades e encontrar uma linha de continuidade entre eles. Teixeira de Pascoaes, não obstante as interpelações do jovem Pessoa, ou por isso mesmo, continuou a ser visto como um poeta anterior à modernidade, um poeta do passado, tributário do século XIX e dos seus modelos, autor duma poesia que desconheceu o versilibrismo e as liberdades do verso modernista.

Também ao acaso abro e leio, desta vez Jacinto do Prado Coelho (1920-84), que fez de resto um inestimável (e desmedido) trabalho editorial sobre a obra de Pascoaes, que seria iniquidade minha esconder, esquecer ou desvalorizar: Quanto à linguagem poética, um regresso: herdeiros do Junqueiro d’ Os Simples e das Orações, ligados também ao romantismo neogarrettista de Nobre, os saudosistas pouco aproveitaram da experiência formal do Simbolismo; preferem uma expressão mais tradicional, mais clássica, o “verso escultural” de Pascoaes; não se demoram num esforço de análise do subconsciente, são muito menos modernos e europeus que os poetas – afinal contemporâneos – do Orpheu. Daí o desentendimento entre Pascoaes e F. Pessoa, que cedo abandonou A Águia, onde o seu espírito renovador se sentia constrangido. (in Dicionário de Literatura, “Saudosismo”, vol. IV, 4º ed., 1997, p. 1007-8)

Percebe-se: sabe tão bem neste rincão pachoucho ser moderno e europeu. Ninguém doutro modo se salva, muito menos no Portugal delambido da cultura, cheio de tiquetaque e urticária ao espelho duma Europa graúda e grossa. Assim como assim, bastava ao autor da frase atentar com cuidado no que antes escrevera – não se demoram num esforço de análise do subconsciente – para se dar conta em toda a linha do engano, quero crer involuntário, do juízo.

***

Desde sempre, desde que me passou pelas mãos um livro de Pascoaes, o que decerto aconteceu no centenário do nascimento do Poeta, em 1977, que percebi o descompasso entre as linhas e as leituras. O que estava nas letras dos livros confrontava com desacerto, mas também com finura, as redutoras sentenças adiantadas pelos comentadores. A rábula dum Pascoaes anti-moderno não batia com o autor que assinou, nos Versos Brancos por exemplo, algum do mais espontâneo e autêntico versilibrismo português da primeira metade do século XX.

A experiência poética, acabada a leitura descomprometida, era afinal muito mais rica e propulsora do que aquela que se continha num juízo equívoco em torno dum Pascoaes acantonado no século XIX. Convenhamos que a visão dum Pascoaes divorciado da modernidade se colou ao poeta como uma segunda pele; dificilmente encontramos uma leitura que dela se afaste. A origem do lugar que se fez comum, se não cliché de gato manso, remonta à revista Presença (1927-40) e aos seus algibebes mais nomeados, João Gaspar Simões e José Régio, que na pressa de fraquearem (de fraque ou froc) os afortunados e muito enfarpelados poetas de Orpheu acabaram por esquecer, se não desnudar, Teixeira de Pascoaes.

Dou a palavra a Sant’Anna Dionísio: A revista Presença, que durante quinze anos representou o sumo e a nata do pensamento literário moderno em Portugal, e em cujas colunas tantas coroas se teceram para enfeitar as frontes de tantos vates nativos e exóticos, nem uma palavra dedicou ao aparecimento de qualquer obra do Eremita de Amarante. E todavia durante esses quinze anos apareceu São Paulo, Santo Agostinho, São Jerónimo, Napoleão, O Penitente – cinco obras que, por si só, dariam a imortalidade ao Poeta em qualquer literatura do mundo. [in O Poeta, essa Ave Metafísica, 1953 (1954), p. 38-39] [3]

Ninguém – a não ser José Marinho – vislumbrou então que a poesia portuguesa encontrava na mensagem mais funda da poesia do vate do Marão o ponto de partida dum novo trilho de desenvolvimento. Pascoaes ficou nu, em pele de galinha, a tiritar de frio nas fragas ásperas do Marão e ao que se sabe não se chateou muito com o assunto, menos interessado que andava nas casacas cómodas do Chiado que nas grandes tempestades de electricidade que lá no céu dele ribombavam. Dava-se por feliz com aquela lua de verdete e calcário que lhe calhara nas sortes; mesmo nu, descalço, intonso, mal arrumado, rústico, esquecido e desurbano, pôde arrancar a grande velocidade para a recta final da sua obra, que começa no São Paulo e termina a uns tantos anos-luz dos nossos olhos, não se sabe bem onde nem para onde.

Mais grave que a falta de visão dos algibebes da Porta do Almedina, que levou a alguns graves atropelos nas avaliações então feitas, é hoje a existência, o ardil, duma crítica chã e bovina, apesar da aparência teratológica, de aligátor, que resume a poesia portuguesa da primeira metade do século XX a um primeiro modernismo, o de Orpheu, e a um segundo modernismo, o da Presença, donde Pascoaes fica naturalmente arredado, já que, para infortúnio dele e nosso, em nenhum dos dois participou.

Assim como assim, é preciso fazer justiça a João Gaspar Simões, que na época madura de afirmação e combate do surrealismo em português, enquanto outros riam e estafavam os últimos saldos, soube bater com a mão na testa e surpreso gritar a exclamação de Arquimedes. Escreveu então algumas palavras com olho de lince e bico de falcão, que por direito próprio justificaram Pascoaes como um grande Poeta até aí ilegível – e este é só o reagente alquímico que revelou as letras originais do palimpsesto-Pascoaes.

***

A recepção do poeta de Marános junto do surrealismo em português, em primeiro lugar de Mário Cesariny, já na transição da primeira para a segunda metade do século XX, afigura-se-me por tudo isto e ainda por direito próprio do maior relevo e só espanta que os admiradores e os estudiosos de Cesariny, dentro e fora de portas, ainda não tenham pegado na ponta do novelo, que tem fio para muita novidade e revisão. O surrealismo que se falou e fala em Portugal foi para Teixeira de Pascoaes nada menos que o formidável reagente que arrancou da invisibilidade as letras esquecidas (e até aí irrisórias) da sua poesia, sem distinção de verso ou de prosa. Estão aquelas assim para o surrealismo em português como as de Lautréamont estão para o de língua gaulesa. Nenhum outro precursor oferece em Portugal ao surrealismo o que Pascoaes lhe foi e é capaz de dar: uma estrela de dimensão maior, cuja luz teimava em ficar oculta. Mérito do reagente, que decifrou os hieróglifos primitivos e modernos do megalito do Marão, percebendo neles uma propulsão de futuro, e merecimento também e ainda do corpo do aerólito, cuja alma, ao contrário do que pensava e afirmava aquele crítico que reduzia a obra a uma intuição étnica, ia muito além de Almeida. [4]

A combustão do surrealismo em português a partir da voz de Pascoaes é facto, além de comovente, probatório; testemunha ele que Pascoaes não foi um meritório e arrumado poeta do século XIX, equivalente a muitos outros, mas um criador raro e intemporal, cheio de vigor e originalidade, capaz de interessar, já depois das vanguardas e do modernismo, o primeiro, o segundo e os adjacentes, um grupo de poetas portugueses da segunda metade do século XX. Para nós, depois do surrealismo em português, Pascoaes passou a ser um primitivo-moderno (ou um moderno que não abandonou o primordial); [5] antes dele, quando Presença quis pôr a parvónia à la page, era tão-só um poeta do século XIX, romântico, neo-romântico, lusitanista, anti-moderno, blandicioso, ou tão-só ingénuo-simples, digno de desdém (o que de feito foi, ou não tivesse trasladado em prosa e reescrito em verso, sempre em jeito de autobiografia, O Pobre Tolo).

Para essa rotação, bastou que o surrealismo em português procurasse a fractura duma dimensão mítico-simbólica, que estava além do horizonte da afirmação temporal e geracional que caracterizara a geração ou as gerações modernistas das vanguardas, interessadas apenas em valorizar a velocidade ostensiva do contemporâneo. É conhecida – e de aplaudir por inteiro – a indiferença de André Breton diante do moderno pelo moderno, como se aquilo que de verdade lhe interessasse tanto se encontrasse no passado, no presente, no futuro ou noutro tempo qualquer a inventar. O autor de Arcano 17 não distinguia entre o antigo e o moderno mas entre o maravilhoso e o patético. E acabou mesmo, de resto como o Artaud dos Tarahumaras, a valorizar o passado, o mais antigo de todos, o da pedra polida, o primordial, diante do perfunctório, quando não do horror agónico, do presente, esse presente ossuário, metálico e futurista, Manhattans de vidro e chips-chips, mas destituído de todo o plano humano, ético e mágico.

O que me proponho neste escrito, mais em jeito de memento e apólogo que de ensaio, é dar um primeiro contributo ao conhecimento da recepção de Teixeira de Pascoaes junto do surrealismo em português. Acredito que o subsídio, por mínimo, interessa muito a Teixeira de Pascoaes mas também vai bem aos surrealistas portugueses. O Poeta do Marão tem grandeza suplementar com a leitura entusiástica de gente como Mário Cesariny, Artur Manuel do Cruzeiro Seixas, Ernesto Sampaio, mas a singularidade destes também se vê melhor através de Teixeira de Pascoaes. E além de lente, este é filtro também. É bem possível que só através dele, Teixeira de Pascoaes, o surrealismo em português encontre o coador à medida de reter e vazar (entenda-se, deitar fora) o grosso, que em nada lhe interessa ou convém, dando saída e consagração, com vista ao futuro da vida, à parte fina, fluida e genuína das suas realizações.

Quero assim deixar aqui, sem mais, um trabalho de rememoração da tessitura (desnorteante, baralhadora de certezas) que é a trama de Teixeira de Pascoaes nas palavras do surrealismo em português. É um preliminar a um desenvolvimento posterior e a uma conclusão – a tirar, mais tarde, se assim se quiser – do século XX poético português. Por agora, interessa a proposta – desenhar de memória a carta dum território imaginário, balizado por Teixeira de Pascoaes e pelos surrealistas em português – e o primeiríssimo desenvolvimento, o aperitivo em jeito de passeio, nas palavras que se seguem.

 

NOTAS

1. O autor, nas sucessivas reedições do manual (cuja derradeira é já do final do século XX, 1995), não mexeu, não reviu, não alterou o sentido (e muito pouco a letra) das palavras que dedicou a Teixeira de Pascoaes.

2. Li hoje quási duas páginas/ Do livro dum poeta místico,/ E ri como quem tem chorado muito. Há dissertação, de Nunes da Rocha, depositada na biblioteca da Faculdade de Letras, dedicada em pormenor ao assunto – as relações de Caeiro com Pascoaes. Foi orientada por Miguel Tamen e António Feijó (Poetas Carpinteiros–Uma Reflexão sobre a Utilidade da Poesia a propósito da vontade de rir de Alberto Caeiro quando leu Versos de um Poeta Místico, tese de mestrado em Teoria da Literatura, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2002). Não tem referência a Mário Cesariny, mas cita o Teixeira de Pascoaes por este  seleccionado nos Aforismos (p. 4).

3. Em vez dos cincos livros citados por Sant’Anna Dionísio, dois deles publicados fora do arco de duração da revista coimbrã (1927-1940), guardem-se três (São Paulo, São Jerónimo e Napoleão), acrescentem-se O Homem Universal (1937), o Livro de Memórias (1928) e os sete volumes das Obras Completas (1929-32) e teremos a verdade ainda mais crua e indecorosa das palavras do autor de Pensamento Invertebrado.

4. Há – que eu conheça – uma excepção: Bernardo Pinto de Almeida, estudioso de Mário Cesariny e leitor fugaz (mas concernente) da sua relação com Teixeira de Pascoaes, por meio dos desenhos deste. É leitura, a meu ver, muito mais lhana e larga que a de Osvaldo M. Silvestre (já citada e com valor quase só bibliográfico, pois de todo desconhece o que fosse, seja ou for a escrita de Teixeira de Pascoaes).Transcrevo (e subscrevo): Não havendo entre nós tradição quase alguma de povoamento imaginário isto é, dessa capacidade de projectar sonhos através das obras de criação plástica (...), Pascoaes surgia como o autor de uma obra  vasta e consequente mas, sobretudo, como aquele que tinha assumido, em inteira autonomia e o mais radicalmente que era possível, essa dimensão do irracional, que tanto poderia surpreender os jovens poetas e artistas que tentavam tornar também portuguesa a Revolução Surrealista Internacional./ Tendo-o conhecido desde muito cedo, Mário Cesariny, que privou com o poeta e foi assiduamente visita de Gatão, bem como alguns dos seus companheiros, entre os quais Cruzeiro Seixas, necessariamente haveriam de ter compreendido através desses desenhos e pinturas deste inesperado mestre, toda uma dimensão de sonho e fantasmagoria que valia bem o não termos tido um Victor Hugo./ Eis pois razões que bastem para que se redescubra Pascoaes não apenas pela sua grandeza própria, intrínseca, mas também por essa vasta influência que faz de qualquer legado uma herança que só se reavalia em toda a sua extensão quando assim o tempo chega de deixar claras as contas. [in “Pascoaes ou a dramaturgia dos Espectros” (v. “Uma Bibliografia”)].  

Por causa deste texto de Bernardo Pinto de Almeida escreveu António Telmo uma nota [“A Cabra”, (v. “Uma Bibliografia” e nota 40)] sobre Teixeira de Pascoaes, o Surrealismo e Mário Cesariny, que motivou carta minha de protesto ao autor de Arte Poética.  Disse-lhe na altura, e mais digo hoje, que as palavras dos surrealistas portugueses acrescentam grandeza a Pascoaes e que a sumptuosidade, a diferença, a elevada alma (funda também) do surrealismo em português, não se entende sem se perceber a leitura que ele fez, contra os ácidos ventos e as negras marés do tempo que lhe foi circunstância, do autor dos Cânticos ou dos Cantos Indecisos, que, se não clamam por Maldoror, são porém tão essenciais e instintivos como o mar e o trovão, o sal e o vento, a árvore e o risco do relâmpago. Lástima minha é que quem tão bem soube saudar Teixeira de Pascoaes, como José Marinho por exemplo, não tenha sabido em simultâneo reconhecer – melhor, dizer – a grandeza de M. Cesariny, A. Maria Lisboa e Cruzeiro Seixas, todos contas afinal dum mesmo e muito antigo fio, esse que vem dos cantares maninhos dos moçárabes das karjas e vai direito para a saudade perturbadora de Dinis, Usque, Bernardim, Camões, Gaspar Frutuoso, Fernão Álvares do Oriente, Agostinho da Cruz, Bernardo de Brito, Manuel de Melo [o cabalista (de Cesariny)], Sampaio Bruno, Pascoaes, Pessoa & companhia. E Ernesto Sampaio (1935-2001), o grande visionário de Luz Central, o mais enérgico teórico do surreal em portuguesa língua (depois de António Maria Lisboa), também lhe pagou pesado tributo (a ela, saudade) como se vê e se verá cada vez melhor no seu muito vivido e sofrido testamento escrito, Fernanda (2000).

5. É do Teixeira de Pascoaes final este cogito de longo e perene alcance (in Dois Jornalistas,cap. XV, 1951): Uma ideia quanto mais antiga, mais moderna. A pintura modernista é contemporânea de Sesóstris. O futuro é o regresso ao passado. António Maria Lisboa, pela mesma época, gritava que o futuro é tão antigo como o passado (carta a Mário Cesariny, in Poesia de António Maria Lisboa, 1977, p. 280). Percebe-se a identidade dos propósitos, a proximidade dos destinos, a força dos mitos, a coincidência das mãos e dos ombros num tempo limpo e encantado, anterior à moeda (como valor de troca e sistema financeiro, representando por um lado a riqueza e sinalizando por outro as potencialidades destrutivas da acumulação económica) e fora de qualquer História.

Capítulo do livro Teixeira de Pascoaes nas palavras do surrealismo em português, de António Cândido Franco (Editorial Lincorne, Portugal, 2010). Reprodução autorizada pelo Autor.

 

 

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