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COORDENAÇÃO EDITORIAL   |   SOARES FEITOSA | FLORIANO MARTINS
2000-2010
 

 

 

 

BANDA LUSÓFONA | PORTUGAL

Travanca Rego | (1940-2003)

Evocando Travanca Rego, a um lustro do seu falecimento

Nicolau Saião

Encontrei-me com J. O. Travanca-Rego, pela primeira vez, no decorrer da inauguração duma exposição colectiva de obras de alguns pintores alentejanos – uns vivos, outros já falecidos – que organizei em Portalegre com o apoio do sector cultural dessa época do município desta cidade.

Já de há certo tempo nos carteávamos. Quem nos pôs em contacto foi o José do Carmo Francisco, que aliás me mandara poemas dele para um suplemento elvense que então orientava, o “Miradouro” do defunto Notícias de Elvas.

Assim que lhe li os versos de imediato me dei conta que não estava ali uma voz de vulgar amenidade. O mesmo que senti quando pela vida fora tenho estado a contas com outros autores que muito estimo: ele sabia o que dizia, quando o dizia e como o dizia. Não era (não é) e creio que não será por muitos anos e bons, um autor de lugares simétricos carreados por um talento urbano e suave. Em Travanca-Rego há o espanto, a garra, o meditar de muitos mistérios que na poesia e pela poesia se consubstanciam. E, no entanto, existe paralelamente uma harmonia que nos seus momentos mais altos nos comunica a certeza de que no seu discurso, na sua linguagem, tudo faz o verdadeiro sentido e é dotado de um padrão interior votado à permanência no tempo.

 “A pena valerá que mais palavras/ suportem a voz nua a (des)dizer-se/ como selámos todos – enigmáticos - / uma dúvida perante o indizível?”, diz-nos ele nos versos iniciais de “Comunicação”, o terceiro poema do seu “Sinais: 15 poemas de sideração e saudade”.

Siderado e saudoso do que não sabe definitivamente, me parece ter sido o tónus poético deste autor. Interrogativo e em certos casos crepuscular, em Travanca-Rego há como em muitos outros – mas nele com a acuidade dolorosa que o seu passamento veio confirmar – uma amargura filha dum espanto e duma melancolia abertos à procura, contudo, de novos ritmos e da maneira de dizer mais exacta, mais real e adequada aos diversos momentos daquilo que se sente e por isso se descreve. Descrição, comunicação… No fundo, doação de descobertas, de universos que se encontram no percurso que mal ou bem o poeta efectua quotidianamente a despeito das suas mágoas e das suas alegrias, ou para dizer doutra forma: os poemas que encontram a sua existência nessa escrita que se fornece a todos para que a leiam e assim revelem o mundo - que em todos vive, mas que o poeta encarnou.

Diz ele em “Ilha”, arrolado em “Cinco Incisões”: “Deixa-me contar o tempo/ pelos nós dos dedos. Nesta ilha,/ nem estrelas nem uma árvore!”. Mas o poeta efectua a religação mediante os poemas, as palavras que articula ainda que algo o destroce ou, melhor, tente destroçar-lhe o sentido do que cria. Travanca-Rego, sendo um autor de clara vocação lunar, nocturna e aforística, não se compraz nesse mergulho, não se recreia na convulsão: o que ele tenta é efectivamente encontrar uma medida para que esse caos seja reordenado e se extinga como tal, passando para o lado solar das propostas de vida plenamente erguida: “Grão de trigo,/ feitio de um ventre:/ Um planeta/ te habita?”, pergunta ele na primeira quadra do pequeno texto “Intimidade(s)” de “Extracto sensitivo”. Ou seja: o universo contido num pequeno elemento da vida vegetal, o que está no alto tornando-se igual ao que está em baixo como na Tábua alquímica da tradição e da sageza.

Travanca-Rego soube pesquisar o mistério, assim tentou devassar o segredo da esfinge. Perplexo ante os enigmas cumpriu contudo a sua íntima tarefa, se alguma tem o poeta.

 Pôde, portanto, afirmar num trecho do seu “Sentido sexto”: “Onde habitasse o desespero alheio,/ deveria ter construído a minha casa!/ - Onde habitasse um pássaro sem asas/ pedindo uma árvore ou um veleiro ou/ pedindo simplesmente/ a mão do vento que sob o seu corpo/ - a afogar-se de mágoa -,/ transformasse em Espaço/ o seu canto em mágoas prisioneiro!”

 E não é este, para um autor, um profundo projecto de vida que completamente nos reivindica de pé perante a morte?

 

 

O Projeto Editorial Banda Lusófona foi criado em janeiro de 2010, como complemento ao Projeto Editorial Banda Hispânica. Assim o Jornal de Poesia integra em sua plenitude a poesia de línguas portuguesa e espanhola. Aqui registraremos criação e reflexão, reunindo autores de distintas gerações e tendências, inclusive inéditos em termos de mercado editorial impresso. Aqueles poetas que desejem participar devem remeter à coordenação geral seus dados bibliográficos, seleção de 10 poemas e resposta ao seguinte questionário:

1. Quais são as tuas afinidades estéticas com outros poetas de língua portuguesa?
2. Quais são as contribuições essenciais que existem na poesia que se faz em teu país que deveriam ter repercussão ou reconhecimento internacional?
3. O que impede uma existência de relações mais estreitas entre os diversos países de língua portuguesa?

Todo este material deve ser encaminhado em um único arquivo em formato word, para o seguinte e-mail: agulha.floriano@gmail.com. Agradecemos também o envio de uma fotografia (jpg), assim como de textos críticos, livros de poesia e material jornalístico sobre o mesmo tema. O Projeto Editorial Banda Lusófona é uma fonte de informações que reflete, sobretudo, a ampla generosidade de todos aqueles que dele participam. O acesso a cada país deve ser feito através do selo correspondente.

 
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Cumplicidade expressa: Alfonso Peña, Eduardo Mosches, Gladys Mendía, José Ángel Leyva, Maria Estela Guedes, Soares Feitosa e Socorro Nunes.
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