| 
            
            Astrid Cabral
 
 A Poesia de Soares Feitosa
 
 Psi, a Penúltima — afinal chegou a 
            hora de viajar pela trilha de seus versos. Autor comunicativo e 
            lúcido, Soares Feitosa logo dá a clave da composição na abertura, ao 
            qualificá-la de “heróica, telúrica e lírica”. Acho que o fascínio do 
            livro decorre dessa mescla tão rica, onde o lirismo é vacinado 
            contra o nascisismo. Sua visão de mundo não nasce da estreita 
            janelinha burguesa, mas é a de quem subiu a montanha e só aceitou 
            por moldura o próprio horizonte. Duas tensões, ou contradições 
            dinamizam-lhe a criação: a poesia caudalosa contracenando com a 
            aridez da paisagem nordestina, e a vinculação simultânea ao cósmico 
            e ao cibernético, o eterno anexando o moderno! Dessa dialética brota 
            uma expressão altamente pessoal e conciliadora de extremos, uma 
            síntese que incorpora a dualidade brasileira (enchentes e secas; 
            arcaísmo e tecnologia e outros barroquismos tupiniquins). Os poemas 
            de Psi, a Penúltima, pela eficiente junção da arte e denúncia 
            social, são retratos do Brasil que lembram as fotos de Sebastião 
            Salgado.
 Agrada-me muitíssimo que Soares 
            Feitosa, em pleno mundo tecnológico, se mantenha enraizado ao chão e 
            antenado às estrelas. Que melhor antídoto para a barbárie 
            civilizatória? Enquanto as megalópoles asfixiam o homem, sua poesia, 
            sem abrir mão das conquistas culturais contemporâneas (há inegável 
            lastro de erudição em seu texto) instaura o clima mítico, o ar puro 
            imemorial sem o estigma de poluições e modismos. A comunhão com o 
            cósmico, o social e o divino dá a sua obra a extraordinária dimensão 
            humana. 
 Além de muitas virtudes 
            literárias, seu livro tem para mim a magia de devolver a atmosfera 
            atávica dos avós maternos e paternos. Pecorrê-lo foi um ritual de 
            reencontro com o inconsciente arcaico. Eles imigraram no rastro das 
            águas, e nas malas e cuias vieram os costumes, as saudades e 
            sobretudo a linguagem. Todo amazonense é meio cearense e me orgulho 
            disto. O deleite que experimentei com a leitura dos poemas foi 
            intensificado pelo cheiro sutil das sementes da imburana perfumando 
            as páginas e por outros deflagrados por menções a terra, mel, 
            alecrim, perfumes. Meus aplausos por um livro tão brasileiro e tão 
            bom. Se Mário de Andrade fosse vivo certamente estaria batendo 
            palmas. 
 
 
  Leia a obra de Soares Feitosa
 
 |