Fui eu
André Carneiro
André Carneiro é poeta, contista e romancista, traduzido
em várias línguas. É também jornalista, pintor,
capista, fotógrafo artístico, cineasta, roteirista, pesquisador
em parapsicologia e autor de tese sobre hipnose. Publicou, entre outros,
os seguintes livros de poesia: Ângulo e face, Edart, São Paulo,
1949; Espaçopleno, Clube de Poesia, São Paulo, 1963; Pássaros
florescem, Editora Scipione, São Paulo, 1988; e Birds Flower, tradução
de Leo L. Barraw - Las Arenas Press, USA. Foi tema de tese de mestrado
em universidades.
Não reconheço a face do velho retrato.
Fui eu, sou todos agora, incluído este caderno
e a caneta traçando átomos ligados às minhas
veias.
O céu distante da infância está na terra que
me espera,
fungos, flores, florestas ou asfalto, pedra, objeto,
nevoeiros mais ou menos densos,
nêutrons, prótons, elétrons,
gêmeos idênticos deste coração trêmulo,
desde o beijo até a linha deste verso.
O ar eu queimo no pulmão vermelho.
Para o espermatozóide eleito,
o orgasmo é o clarão iluminando a caverna.
O cotidiano estreito engulo na alquimia transformista.
Há milhões de anos me transformo em planta, inseto
e alma
na fina capa de oxigênio do planeta.
Matéria-prima das galáxias, sou barro para esculpir
a vida eterna. |