Alberto da Costa e Silva

De Pé na Varanda Recordando
       
 
De pé na varanda recordando 
o menino a tosquiar o pêlo do carneiro 
flautas de um azul sobre a terra dos telhados 
enquanto parto adeus! aceno do cavalo 

logo as lavadeiras cantam a branda espuma 
e o focinho estremece do animal detido 
pelas rédeas na mão do menino no açude 
tranqüilo é o sol e o sonho é invertido 

e se alguém nasceu por fugir do silêncio 
nem por isso as palmeiras se cansaram 
de sua sombra de cravo tocado pelos dedos 
e louça da manhã disposta sobre a mesa 

adeus! que já desabam as folhas mamoeiros 
se partem à beira d’água enquanto indago e escuto 
a minha voz o canto de um inferno vencido 
pelo odor das mangas e o prostrado menino 

que soluça tombado sobre o magro joelho 
de um outro (velho) fácil é apear-se a cilha 
se aperta depressa e dóceis são os dias  
que a palavra recria como flores de cacto 

mas vivê-los? vivê-los nem as bilhas 
com sua clara frescura nos devolvem 
esta alegria de sonhá-los altos 
e não a areia pobre que nos deram 

e se pelo natal devoramos castanhas 
de que inverno nascem que dias adormecem 
em sua polpa branca é a camisa que veste  
o corpo solitário a beber o seu vinho 
  
espanco o animal o pranto suja o rosto 
salto o tear das flores até à vista! meus 
são os verões por viver e os campos de dores 
o sol não se disfarça nos olhos dos coelhos.

 

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Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  19  de  Agosto  de  1998