Alberto da Costa e Silva

Natal
 
 
Bruno,
agora que vieste, é bom que saibas:
a vida canta baixinho
e, quando grita,
desatam-se de nós o sonho e o êxtase.

As braçadas de rosas que as meninas
repõem no roseiral
invertem o rio,
fazem de mim a tua sombra antiga.

Procura o branco.
Ainda que o suje o ouro, é branco. Branco
o lençol, a roupa junto ao corpo,
o céu ceifado de nuvens, se amanhece,
e igual, colhido o feno ao sol,
se entardece.

O verde é alegre,
mesmo se a lagarta
recorta o galho e a folha de ferrugem,
se sobre a grama há papéis e latas,
pois vivemos no azul, que se respira
e que se vê
nos olhos de quem nasce.

O fruto cai, amarelo.
Calma. Espera.
É lento este jardim. Lentos, os peixes
com as flores que há no cinza. O cinza é belo.
Como é belo o vermelho. Vê, não correm
no deserto da tarde a cabra e o asno
e sopram sobre a areia com seus cascos
na relva ressequida? Vem do barro
a água da moringa. 

A beleza caminha à tua frente.
Despreza o tigre que há nela, mas
não afasta o afago da urtiga.
O que parece vão e sem mistério,
como as rosas nos braços das meninas,
não pára de nascer
e faz-se eterno.

 

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Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  30  de  Agosto  de  1998