Alessandro Sales estréia na literatura
cearense com o livro "Risco dos Instantes" (2000) com as bênçãos
de Adriano Espínola, Teoberto Landim, Francisco Carvalho e Pedro
Henrique Saraiva Leão. O leitor se deparará com as palavras
destes grandes nomes das letras do Ceará, que poderão orientá-lo.
Além disso, ficam estabelecidos princípios de uma fortuna
crítica bastante positiva. Além dessas luzes que iluminam
"Risco dos Instantes" é a sua poesia que deve se impor, abrir seu
próprio caminho e nos ofuscar com sua própria luz.
A poesia de Alessandro Sales é dona
de um grande destino, pois se mostra comprometida com a palavra, com a
liberdade de expressão advinda da linguagem nas mais variadas formas.
O poeta tem consciência de que a palavra é a matéria
do poema, por isso corre todos os riscos sem temer o que há de vir.
Os grandes autores investem na palavra e na
sua expressão de liberdade para se aproximarem dos homens e das
suas realidades carentes das forças etéreas. "Risco dos Instantes"
se insere neste contexto e nos surpreende.
O livro do jovem poeta se divide em "risco
de vida" e "vida em risco", expressando a unidade da obra e revelando a
tenção própria do homem pós-moderno e o encanto
da poesia que não deseja ser uma espécie de paliativo, mas
uma realização do prazer estético.
Alessandro Sales é um poeta contemporâneo,
não se mostra alienado. Sabe que "os homens mudam em silêncio"
e "a dor é a mesma". Por isso ordena: "muda mundo!" Pois acredita
"que a fôrma que deforma um dia forma a transformação".
A consciência social, o inconformismo,
o coloquialismo, a transitoriedade, a supervalorização da
palavra, o lirismo e o erotismo tornam-se características marcantes
e determinantes em "Risco dos Instantes", que podem servir de reconhecimento
sólido e referencial de uma poesia nascente, impregnada de recursos
visuais, reminiscências salutares do concretismo.
Não há nenhuma forma de manifestação
eólica explícita na poesia de Alessandro Sales, embora o
eolismo seja uma das realidades da literatura cearense. Mas isto não
a inferioriza, nem a torna incompleta. O excesso de urbanidade talvez justifique
a ausência do vento em sua poética.
No poema "Minha Praia" faz-se presente uma
narrativa presa a um discurso direto e indireto, aludindo outra possibilidade
textual sem se desmembrar do tecido original constituído pela poesia,
rainha primeva de todas as falas. A presença da narrativa na poesia
é uma realidade épica, mas há casos que nos fazem
conhecer embriões do epicolírico. O poema mencionado pode
ser um deles:
Sábado, 4 da tarde.
Desço do ateliê
para comprar água.
Émerson, o porteiro:
— Rapaz, dá um tempo,
vai pegar uma praia.
Na volta,
continuo
a mergulhar
em sal e sol
de palavras.
Mal sabe Émerson:
tenho espuma e maresia
à flor da pele.
"Risco de Instantes" concentra em suas páginas,
poemas que encantam os olhos e a inteligência. Esse livro não
padecerá no silêncio da crítica e nem será mais
uma obra morta, neste vasto mundo precário de memórias.
Inocêncio de Melo Filho
Professor da UVA |