Tetos brancos, pedras translúcidas
memória: Cristo vestia-se de morto da Semana Santa
e ressurgia depois, nu, mais morto ainda
no esquife de vidro, santificado.
Substância da vida fluindo no mangueiral
e concentrada em pedrinhas coloridas
às vezes tesouros, às vezes bois e bichos
num imaginário curral.
Substância da morte correndo ao pé da noite
e homens discutindo a linguagem inimiga
num país bem próximo.
As matracas dobravam a tristeza.
Em volta, no átrio,
preparava-se a memória
sobrepelizes brancas e pés descalços
e por baixo de tudo os corações
nus e puros, porém condenados.
Ao meio-dia o silêncio se balançava nas redes
por onde escorria uma vida dolente
e na alma inquieta balançavam-se incubados
os tetos brancos, as pedras
e as plantinhas tenras
de um presépio sem futuro.
A alto de serra, suas macambiras,
suas palmas e seus cascalhos
numa água cristalina:
as moças se banhavam livres
em seus desejos e nas visões do menino.
Um trajeto difícil volta a esta lembrança
de um tempo restrito de sol e de inverno
fabulações intensas e buscas improváveis
em linguagem seca que não tem memória. |