Álvaro Pacheco

Mulher, Como É
 
  
É um ser de espantos
composto de olhos, boca, cabelos
e outros detalhes inapreensíveis.

É um ser diverso
desses universos
construído de impossíveis
anversos, um universo
sem dimensões, protuberante
e macio - uma lágrima
e um destino
numa dor total
um conjunto
de analgésicos prescritos, um ser
sexicomposto
em detalhes que correm e formando
um corpo
se deleitam
no martírio vicário, um ser
possível para os impossíveis

São as partes coloridas
da criação em movimento
ao ritmo
paralisante da luz. São os olhos
nessa boca, os cabelos
nesse corpo, o impossível
nesse sexo dourado, essa presença
no absurdo, a sorte, um ser
para as mortes e espantos, um fato
inevitável, uma lástima
e um alívio
(dos olhos perdidos
da boca fechada
do corpo composto
em braços estranhos, pesadelo
e esperança, a luz e o êxtase
um conforto) - e na hora tranqüila
o desassossego

Oh Barbará
rappelle-toi Barbará
Il pleuvait sans cesse sur Brest ce jour-lá
et tu marchais sourriante, ravie
rappelle-toi Barbará
dessa chuva de ferro, de fogo, de sangue
oh Barbará!

É um ser
dos contrários e contrário
a todas as leis - a desarmonia
mais incrível - e mais bela.

É a matéria
em estado puro
que se compõe de fantásticas visões
e se transforma em corpo e tempo - o tempo indefinível
da boca entreaberta, dos longos cabelos, dos olhos brilhando, dos dedos trêmulos,
para além do que pode suportar
a frágil estrutura da emoção.

 
                                                             Vitória, agosto de 1969
                                                                                   

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 Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  01  de  Julho  de  1998