Álvaro Pacheco

Os Fantasmas
                      
  
Abro a gaveta
onde se esconderam uns fantasmas
e eu guardei outros, disfarçados de palavras,
camisas limpas que não pude vestir
e papel em branco, envoltos
em ninhos de sombras
e pedaços de luz
da lamparina de azeite
 do oratório de minha mãe  -  

 abro a gaveta
vagarosamente, assustado
para que não me assustem
como quando era  menino
e os temia
mas conversava com eles
na escuridão do quarto.

Tenho medo da gaveta
e desses seus conteúdos
que poderão trazer de volta os  fantasmas,
os que guardei e os que se esconderam
apenas esperando  o tempo 
de se apresentarem à  minha solidão
e desesperança
para cobrar a vida que não tivemos
eu e os meus predecessores, eu
e os meus perseguidores,eu
e os que não me amaram `, eu
e os que não pude amar -

esses  fantasmas todos 
perdidos e escondidos
nestas gavetas de ventos e de fantasias
entreabertas pelos vácuos de minha vida
e depositárias,  como fantasmas, 
dos anseios do tempo inteiro,
e do que restou de minha inocência
dos anos de luz, esses curtos anos
de mitos e fantasias
realizados no cristal da infância.

                                       
                                                                                              Rio, 26 abril 95.
                                                                                   

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 Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  20  de  Julho  de  1998