Álvaro Pacheco

A Balada de Londres
                      
                 
Se fosse possível como
um velho muito velho louco de paixão
um marinheiro sem o delírio do mar

um sonhador que não consegue dormir -

uma estrada

uma estrada terrivelmente vazia
de todas as suas máquinas e semoventes
mesmo os microscópicos,

uma árvore nua
e morta, despida
de folhas e frutos,
algumas dessas coisas inaceitáveis -

e também
(porque)
porque você não consegue mais pensar
nos termos precedidos,

é preciso prosseguir
e andar incansavelmente
no implacável círculo das esferas
perseguindo o sol
temperaturas agradáveis
e sorrisos compostos
por crianças e um homem muito velho
que  não mais sonha com a felicidade:

em torno,
pessoas jogam cartas
você ignora a televisão, alguém
precisa ter coragem
de dizer alguma coisa, até mesmo
a verdade: porque (e como)
os ventos nos destroem
esse poema no funeral
o meio do deserto
entre seres estranhos

e você não ter estado
na escola perfeita
apenas para esquecer.

Não se sabe de nada.

Permanecem
insignificantes lembranças
de pessoas antípodas
e países estrangeiros, livros,
algum dinheiro
e a menina loura.
que você não conheceu:

nada mais.

Talvez existam sereias
e poetas jovens - você poderia
ter sido um deles, contudo
it is almost extinguished
the fire inside, e,
na verdade,
você perdeu teus destinos -
não sabe conjugar
tudo que esqueceu
e como esquecer
os jovens poetas
os poetas perdidos
essas terríveis hordas
de sonhadores irrecuperáveis
e comedores de livros.

Peça ajuda ao rio
com suas memórias de infância
sacrifique
todas as lembranças
em suas águas barrentas
nos tempos das chuvas
e não deixe de cantar 
a alegria desses outros tempos
do início do arco - íris

(pode ser
que você ainda não esteja morto),

grite bem alto
pelas velhas árvores
e por suas decisões
da juventude, percorra
as sombras das mangueiras
entre as outras árvores e a floresta
esquecida - confesse:

Você conhece realmente
essas folhas e sombras
e conseguirá lembrar-se
das florestas esquecidas?

Já passei do tempo
de saber quem eu sou
e o que é o amor - alguém mais velho
ou incrivelmente mais jovem
talvez venha a saber -

aconselho-me
a ficar em silêncio
nestes quartos escuros
de grandes cidades
destas velhas e corruptas cidades
parceiras muito antigas
da insensatez dos homens
pensando apenas
nas coisas que se passaram
nos segredos que não apreendi
nem pude compreender
da experiência

nesta
(e em muitas outras,
como velhos insensatos)

very old city.

                                       
                                                                     Londres, 24 agosto 87.
                                                                                   

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 Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  20  de  Julho  de  1998