Álvaro Pacheco  
   
PREMIER TRIPTYQUE 
POUR VINCENT
 
 
 
 
 

          Compõem-se todos os trâmites, ele é um estranho ao código, não lembra nem relembra nenhum signo, contemplou a própria sepultura antes de nascer, um velho antes da criança, ancestral de si mesmo, nenhum subterrâneo, uma árvore comendo suas raízes, sol dissolvido na carne, a melodia desperdiçando-se antes de integrar o ritmo alucinante, incapaz dos mínimos do amor e das claras reduções, cavernas de carvão, ruelas muito velhas num espaço improvável sem florações, necessitando de um novo método matemático para o sistema estrutural das almas perdidas. 
 

          "Vaguei pelos púlpitos das matinas e das vesperais, um estrangeiro, não lembro nem relembro as vozes roucas da pequena multidão de Arles, os equívocos mais evidentes, a fórmula não encontrada e o código indecifrado de Zweeloo, la lettre inachevée de Paul." Ah, 

          "La poésie est plus terrible que la peinture, on cherche toujours le bout quoique la peinture soit plus sale et enfin plus emmerdante. Pour la faire il faut encore un mois de maladie et mort. Comme vous disiez de votre Christ au jardin des oliviers, pas destiné à être compris, mais, enfin, là, j'ai encore des cyprès avec une étoile, une étoile à éclat exagerée, éclat doux de rose et vert dans le ciel d'outremer où courent les nuages... et un très haut cyprès, tout droit, tout sombre, un arbre qui nous mange les racines, qui mange tout, la lumière est mon cerveau, elle est partout dans cette code, l'absurde du travail inachevé aussi aussi aussi. Je suis étrange partout. Comme disait le Docteur Gachet, c'est difficile d'être simple." 
 

          Avez-vous vu les oliviers? 

          Vonnas, setembro 91. 
          DEUXIÈME TRIPTYQUE POUR VINCENT 

          "Dimanche matin, à 11 heures 1/2 du matin, le nommé Vincent Van Gogh, peintre, originaire de Hollande, s’est presenté à la maison de tolérance número 1, a demandé à Rachel et lui a remis... son oreille en lui disant: 'Gardez cet objet précieusement.' Puis il a disparu. Informé de ce fait qui ne pouvait être que celui d'un pauvre alliené, la police s'est rendue le lendemain matin chez cet individu qu'elle a trouvé couché dans son lit, ne donnant presque plus signe de vie. 
Ce malhereux a été admis d'urgence à l'hospice." 
 
 
          Paul sort après le dîner, seul. O sangue e o sexo se impõem   sobre os retratos dos vivos e em suas inspirações mais inocentes, não a luz nem as cores ou as sínteses dos girassóis atormentam assim, como uma discussão nascida entre condenados e solitários, preparou-se meticulosamente para fazer emergir o sol do coração dos girassóis secos, criar para eles em um solstício de verão, uma tragédia de poetas gregos desconhecidos, não abordados pelo Professor Mendes da Costa, Paul veio de Paris para compartilhar as duas camas da Maison Jaune, os dois apoios de palha seca, as doze cadeiras e o espelho: "vamos gozar - nós, os escolhidos, só gozamos com os olhos", que os outros mortais fecham no momento do orgasmo, jamais concordamos com o mesmo retrato e a mesma paisagem, para isso fomos feitos, ao próximo, como os girassóis, é preciso assassiná-lo com uma navalha aberta, com um grande leque oriental quando ele voltar- somos sempre contra o que amamos, o coração não agüenta o peso dos olhos e os olhos fixados são os mais duros de carregar, tudo pode se passar à noite quando o Blanc de Zinc tanto pode servir para escurecer as trevas como para eliminar algumas sombras e dar à luz uma força que se projeta na alma, eviscerando-a de um pedaço de carne que é assim transubstanciada e projeta a loucura. 
 
          Je voudrais peindre des hommes et des femmes avec je ne sais quoi d'éternel - ao invés disso a natureza foi se escurecer nos subterrâneos do Borinage, os olhos queimados pela luz para se auto-inventarem nos campos de trigo e milho e nos jardins dos hospícios, onde se embalsamam cérebros que não são tirados pelo nariz - pelos séculos afora, Giotto, Rembrandt, Botticelli e Dante esperam pelos ciprestes - sempre os ciprestes, um japonês pagou pelos girassóis  os vinte e dois milhões de dólares que eram necessários para sustentar Gauguin, a Maison Jaune e os girassóis - este é um prenúncio, como um rio que chega subitamente a uma cidade medieval que padecia de cólera, ladeado de roseaux e girinos imóveis, há que criar tudo entre maio e junho, não resta mais nenhum tempo projetando-se para trás e para a frente, como o verdadeiro desconhecido - não há nenhuma virgem disponível que possas esperar, emergir da sombra para a luz e voltar à sombra. "Si importe la foi, qui me délivrera du cadavre de ce mort?" Ce n'est pas à la peinture qu'il songeait lorsqu'il prêchait. 
 

          À quelle mort songe Vincent? 

Vonnas, setembro 1991.
 
 
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Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  20  de  Agosto  de  1998