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OS ANOS TERRÍVEIS
 
 Os anos terríveis estão chegando 
 quando se acorrenta a juventude 
 a reflexões causticantes 
 que, desesperadamente, sem pressa, 
 fazem marcas na pele e nos primeiros 
 cabelos brancos. 
   
 Eles são a primeira mulher perdida,
o primeiro nome 
 que não socorre do passado 
 o primeiro instante sem euforia 
 mesmo química -  
 e quando se precisa de um anestésico 
 para a saudade e imaginamos 
 um vôo sem rumo de caravela 
 na geometria de asas das velas e dos ventos. 
   
 Mas os anos terríveis também 
 nunca ficaram para trás nem precisam
ser 
 os que estão chegando - as reflexões 
 são as mesmas dessa química
substrata 
 que atinge apenas os mitocôndrios ou
outros 
 mensageiros ou portadores da eternidade 
 nos dois sentidos que ela impõe, esses
anos 
 podem estar esperando num castelo em Duíno 
 ou navegando a bordo do La Grive, 
 vindo das ilhas desgarradas 
 de Homero ou George Séféris. 
   
 Superá-los contudo, 
 será construir um mausoléu de
água 
 no meio das pedras, 
 deixar fenecer o desejo e os olhos 
 das mulheres que não nos amam. E 
 fazer um banquete fictício em cada
estação 
 como um senhor medieval, com bufões, 
 engolidores de fogo, saltimbancos e lutadores
romanos, 
 sendo apenas o passante desinteressado 
 que paga um preço qualquer pelas repetições, 
 sem nenhum reconhecimento. 
   
  
Londres, setembro
91. 
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