Auta de Souza

1. À Memória de uma Ave
2. À minha avó
3. Cantiga
4. Teus Anos

 

À Memória de uma Ave

 Quando morre uma criança, 
Diz-se que o pálido anjinho 
Voou como uma esperança. 
Foi para o céu direitinho. 

Mas nossa mente se cansa 
A voar de ninho em ninho, 
Interrogando a lembrança, 
Quando morre um passarinho. 

Só eu, se alguém diz que a vida 
De uma avesinha querida 
Se extingue como um clarão. 

Ponho-me a rir, pois, divina! 
Ouço cantar, em surdina, 
Tu’alma em meu coração.
 Jardim - 1893

A MINHA AVÓ
 

Minh’alma vai cantar, alma sagrada!
Raio de sol dos meus primeiros dias...
Gota de luz nas regiões sombrias
De minha vida triste e amargurada.
 

Minh’alma vai cantar, velhinha amada!
Rio onde correm minhas alegrias...
Anjo bendito que me refugias
Nas tuas asas contra a sina irada!
 

Minh’alma vai cantar... Transforma o seio
N’um cofre santo de carícias cheio,
Para este livro todo o meu tesouro... -
 

Eu quero vê-lo, em desejada calma,
No rico santuário de tu’alma...
-  Hóstia guardada n’um cibório de ouro! -
 

CANTIGA
 

Meu sonho dourado e leve,
Que buscas tu a voar?
Um ninho branco de neve
Onde me deixem cantar.

......................................

E em busca das nuvens belas
Lá vai meu sonho a cantar...
Meu sonho cor das estrelas,
Meu sonho cor do luar.

Pergunto ao sonho chorando,
Por que foges a cantar?
E ele responde, cantando:
Por que foges a cantar?

......................................

E em busca das nuvens belas
Foi-se meu sonho a cantar...
Meu sonho cor das estrelas,
Meu sonho cor do luar.
 

TEUS ANOS
A Eugênia B. de Albuquerque Mello
 

Teus anos amanhã. Fui ver, contente,
(E como procurei por toda parte!)
Um mimo que te desse... e achei, somente,
Meu triste coração, mimo sem arte.
 

Mas... o que dirás tu quando, de leve,
Bem cedinho batendo à tua porta,
Vires meu coração frio, de neve,
Pobre flor sem perfume e quase morta?
 

Manda-o entrar... E diz, ó doce amada!
Que ele se aqueça d’esse olhar no brilho...
Vai de tão longe te pedir pousada:
Deixa-o ficar no berço de teu filho...

Angicos, - 2 de Maio de 1896.
 

Remetente: Walter Cid
 


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