Olavo Bilac
O Rio
Da mata no seio umbroso,
No verde seio da serra,
Nasce o rio generoso,
Que é a providência da terra.
Nasce humilde; e, pequenino,
Foge ao sol abrasador;
É um fio d'água, tão fino,
Que desliza sem rumor.
Entre as pedras se insinua,
Ganha corpo, abre caminho,
Já canta, já tumultua,
Num alegre borburinho.
Agora ao sol, que o prateia,
Todo se entrega, a sorrir;
Avança, as rochas ladeia,
Some-se, torna a surgir.
Recebe outras águas, desce
As encostas de uma em uma,
Engrossa as vagas, e cresce,
Galga os penedos, e espuma.
Agora, indômito e ousado,
Transpõe furnas e grotões,
Vence abismos, despenhado
Em saltos e cachoeirões.
E corre, galopa, cheio
De força; de vaga em vaga,
Chega ao vale, alarga o seio,
Cava a terra, o campo alaga . . .
Expande-se, abre-se, ingente,
Por cem léguas, a cantar,
Até que cai finalmente,
No seio vasto do mar . . .
Mas na triunfal majestade
Dessa marcha vitoriosa,
Quanto amor, quanta bondade
Na sua alma generosa!
A cada passo que dava
O nobre rio, feliz
Mais uma árvore criava,
Dando vida a uma raiz.
Quantas dádivas e quantas
Esmolas pelos caminhos!
Matava a sede das plantas
E a sede dos passarinhos . . .
Fonte de força e fartura,
Foi bem, foi saúde e pão:
Dava às cidades frescura,
Fecundidade ao sertão . . .
E um nobre exemplo sadio
Nas suas águas se encerra;
Devemos ser como o rio,
Que é a providência da terra:
Bendito aquele que é forte,
E desconhece o rancor,
E, em vez de servir a morte,
Ama a vida, e serve o Amor!
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *