Castro Alves

O HÓSPEDE

Choro por ver que os dias passam breves E te esqueces de mim quando tu fores; Como as brisas que passam doudas, leves, E não tornam atrás a ver as flores. Teófilo Braga
Onde vais, estrangeiro! Por que deixas O solitário albergue do deserto? O que buscas além dos horizontes? Por que transpor o píncaro dos montes, Quando podes achar o amor tão perto?... "Pálido moço! Um dia tu chegaste De outros climas, de terras bem distantes... Era noite!... A tormenta além rugia... Nos abetos da serra a ventania Tinha gemidos longos, delirantes. "Uma buzina restrugiu no vale Junto aos barrancos onde geme o rio... De teu cavalo o galopar soava, E teu cão ululando replicava Aos surdos roncos do trovão bravio. "Entraste! A loura chama do brasido Lambia um velho cedro crepitante, Eras tão triste ao lume da fogueira... Que eu derramei a lágrima primeira Quando enxuguei teu manto gotejante! "Onde vais, estrangeiro? Por que deixas Esta infeliz, misérrima cabana? Inda as aves te afagam do arvoredo... Se quiseres... as flores do silvedo Verás inda nas tranças da serrana. "Queres voltar a este país maldito Onde a alegria e o riso te deixaram? Eu não sei tua história... mas que importa?... ... Bóia em teus olhos a esperança morta Que as mulheres de lá te apunhalaram. "Não partas, não! Aqui todos te querem! Minhas aves amigas te conhecem. Quando à tardinha volves da colina Sem receio da longa carabina De lajedo em lajedo as corças descem! "Teu cavalo nitrindo na savana Lambe as úmidas gramas em meus dedos, Quando a fanfarra tocas na montanha, A matilha dos ecos te acompanha Ladrando pela ponta dos penedos. "Onde vais, belo moço? Se partires Quem será teu amigo, irmão e pajem? E quando a negra insônia te devora, Quem, na guitarra que suspira e chora, Há de cantar-te seu amor selvagem? "A choça do desterro é nua e fria! O caminho do exílio é só de abrolhos! Que família melhor que meus desvelos?... Que tenda mais sutil que meus cabelos Estrelados no pranto de teus olhos? ... "Estranho moço! Eu vejo em tua fronte Esta amargura atroz que não tem cura. Acaso fulge ao sol de outros países, Por entre as balças de cheirosos lises, A esposa que tua alma assim procura? "Talvez tenhas além servos e amantes, Um palácio em lugar de uma choupana, E aqui só tens uma guitarra e um beijo, E o fogo ardente de ideal desejo Nos seios virgens da infeliz serranal. . ." ————— No entanto Ele partiu!... Seu vulto ao longe Escondeu-se onde a vista não alcança... ... Mas não penseis que o triste forasteiro Foi procurar nos lares do estrangeiro O fantasma sequer de uma esperança!...

* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *