I
Márcio, flor do meu ser, fruto do meu amor,
Eu, que tanto sonhei, tanto lutei e tanto
Sofri para viver, não vivera, entretanto,
Se me não desse Deus em ti um sucessor .
Que ventura que sinto, às vezes, ao supor
Que a seiva do meu sangue e o orvalho do meu pranto,
Com o espírito de um sábio e o coração
de um santo,
Me farão reviver na tua vida em flor!
Possas tu conseguir o fugitivo encanto
Da glória, que busquei no perene verdor
Da coroa de louro ou da palma de acanto.
Que em ti germine em luz a semente de dor
Que ao destino atirei, para que, no teu canto
Bendigas em teu pai a mão do Semeador.
II
Mário, meu filho, em ti lembro, a todo momento,
A doce companheira, a mulher singular
Que, pela inteligência e pelo sentimento,
Era a luz, a alegria, a graça do meu lar.
Como suave consolo ao meu rude tormento,
Na impressão do sorriso e na expressão do olhar,
Evocas, sem saber, num sonho vago e lento,
Aquela a quem amei, amo ainda, e hei de amar...
Órfão do seu afeto, herdaste o seu encanto,
Para mais me enlevar, para mais me prender,
Como se eu, como pai, já não te amasse tanto.
Mário, eu vivo por ti, mas não queiras saber
Quando, fitando os teus, baixo os meus olhos em pranto,
Se estas lágrimas são de dor ou de prazer...
III
Benedicto, meu filho, em teu sonho impoluto,
Que não possas prever, nem sentir, nem supor
Que, ao nascer, foste logo enfaixado de luto
E embalou o teu berço o anjo da minha dor.
Eu, que de cada filho o destino perscruto,
Fico a pensar em ti que, embora humano, por
Uma lei natural, tens a sorte do fruto
Que, na ânsia de viver, causa a morte da flor.
Se no signo fatal que trouxeste medito,
Rogo a Deus, como pai, para te conceder
As virtudes e os dons do meu sonho infinito...
Se nasceste infeliz, deves feliz viver,
Para com fé e amor bendizer, Benedicto,
Aquela que morreu porque te deu o ser. |