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Página atualizada em 7.8.2000
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Miguel Sanches Neto
<msanches@pr.gov.br>
 

A POESIA DE SEBASTIÃO UCHOA LEITE
 

A ETERNA ESPREITA


[Revista Bravo ed. ago/2000]

          Vivemos um  momento em que a obra de arte encontra-se apertada pelos sentidos, nem sempre os mais corretos, agregados a ela. Décadas atrás, Mário Quintana lamentava não encontrar uma edição de Os Lusíadas sem as doutas notas de rodapé, antecipando o mal-estar criado pela atual ditadura teórica, tão presente hoje na poesia, não apenas nas introduções mas principalmente na estrutura e no léxico poéticos.

          Este é o caso de Sebastião Uchoa Leite, cuja minúscula poesia ficou espremida entre as orelhas assinadas por Haroldo de Campos, o longo prefácio de João Alexandre Barbosa e a nota final, em castelhano, de Adolfo Montejo Navas, no volume A espreita (Perspectiva, 2000). A impressão que se tem é de uma poesia prisioneira de comentários hiperbólicos, o que contraria a sua própria configuração despojada e despretensiosa. À poética atonal de Uchoa os comentaristas opõem uma leitura grandiloqüente. 

          Isso cria um descompasso entre a produção de um competente poeta menor e as invenções críticas de seus amigos que escrevem textos laudatórios, vestindo-os com os trajes a rigor da interpretação acadêmica. É verdade que a culpa, se é que ela existe, é do próprio autor, que aceita e exerce a autoridade da apreciação estética, inclusive incorporando ao domínio do poético o jargão analítico, de tal modo que não percebemos nenhuma mudança ao passar dos comentários para os textos. 

          Escrevendo poemas lacônicos, pretensamente enigmáticos, uma vez que só há enigma quando existe uma única resposta possível, o autor dá margens para toda e qualquer interpretação. Assim, a poesia passa a ter significado apenas fora de si, potencializando as teorizações, que podem ser as mais delirantes e estapafúrdias. A grandeza do texto criativo, segundo esta ótica, é estabelecida pelos comentadores credenciados, cabendo ao poeta dilatar a abertura semântica dos poemas e cultivar leitores bem cotados na bolsa de valores literários.

          Ignorando este aparato, e lendo com a atenção voltada unicamente para os poemas, podemos ver em A espreita uma reprise do único tema de certa poesia contemporânea, que encena em seus versos o vazio, utilizando alguns jogos de palavras que não levam a lugar nenhum, embora criem uma aura moderna, reverenciada como distintivo da grande poesia, embora nada tenha de grande ou de importante, não passando de uma brincadeira inconseqüente do tipo “a rua pétrea / de pedestres / com pressa”. O adjetivo “pétrea” cumpre uma função meramente decorativa.

          Tudo bem pesado, podemos afirmar que se trata de uma poesia de negação, fundada em palavras acrescidas de prefixos negativos, tais como “incósmico”, “antifilosófica”, “desenigmação”, “desconstruir”, “des-ordem”, “desrazão”, “indecifradas”,  “desmemória”, “irrespiratório”, “incivilizar-se”, “desplugar-se”, etc – como se escrever poesia fosse criar neologismos esdrúxulos. É nesta inversão que se sustenta um versejar que tem como eixo axial a recusa da própria poesia, assunto velho e repisado por muita gente boa e ruim neste nosso século de equívocos: “Todo poético é inimigo [...] / Quem falou em poesia? / Alguém / Cospe”(p.80). 

          Outra marca do livro é a referência a grandes escritores, seja de forma direta, com citação de trechos, seja através de adjetivos biográficos (“nuvens baudelaireanas”, “inferno alighierico”, “mallarmaicos brindes”), o que não é suficiente para encobrir as inúmeras frases feitas que aparecem soltas nos poemas, mostrando apenas uma entrega ao lugar-comum e a uma escrita de repetição. 
Tudo isso revela que Sebastião Uchoa Leite, posicionando-se a reboque de uma biblioteca intransigente, lida e relida até a exaustão, produz uma poética de saldos de leitura, longe portanto da criação de um universo particular, tal como acontece com os escritores necessários à língua.
 

Arquivo eletrônico
remetido pelo autor
<msanches@pr.gov.br>
Espaço para defesa:

Subject: 
        Poesia do Uchoa
   Date: 
        Wed, 16 Aug 2000 19:58:50 -0300
   From: 
        Carlos Pessoa e Lúcia Rosa <meiotom@uol.com.br>
     To: 
        <jpoesia@secrel.com.br>
 

Não sou conhecedor da obra de Sebastião Uchoa Leite, mas ao ler a crítica de Miguel Sanches Neto - e aqui também faço uma: que local mais infeliz para colocar o  nome do responsável pelo artigo. Fiquei indignado com a superficialidade sua análise levando-se em conta os exemplos citados que no meu entender, um leitor de poesia, são de uma força poética indiscutível. Todo poético é inimigo (...)/ Quem falou em poesia?
Alguém/ Cospe possui um força imagética e um conteúdo atmosférico de causar inveja a qualquer poeta. Já em A rua pétrea/De pedestres/ Com pressa, compreendo menos ainda a opinião do crítico. Pétrea tem a força da frieza das almas e das lápides e oferece à poesia uma qualidade que A rua/ De pedestres/ Com pressa, certamente, não teriam.
Quem inventou mais? Os amigos do poeta ou o olhar do crítico? Lerei a obra toda. Obrigado pela dica.

Carlos Alberto Pessoa Rosa
E-mail: meiotom@uol.com.br


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