Fernanda Botelho
Poema
					Negue-se o mundo a me dizer: sim!  
					Negue-se o ar da serra aos meus pulmões!  
					Fechem-se as janelas porque vim 
					interromper os solheiros e os pregões! 
					Neguem-me o passaporte 
					pra o estrangeiro!
					Encontre-se sem norte 
					e sem dinheiro 
					(e desprevenidamente des-emotiva!) 
					frente às rodas paralelas 
					duma qualquer locomotiva, 
					ou entre elas,
					ou melhor: debaixo delas!
					— Por tudo encolherei os ombros
					que, em suma, dizem crentes e descrentes
					a vida é feita de rombos e de tombos, 
					doença, hostilidade e guinchos de serpentes.
					Mas tu — (Homem!  Garra!
					Sucesso! ou Vento! ou Amarra!
					Vício alegre! ou Labirinto!
					Bebedeira de absinto
					Filhos!
					E Deus neles!)
					— não me negues o tom simples
					e às vezes reles 
					da tua voz pura-impura 
					com que seques
					a minha vil e vã desenvoltura.
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