Alberto Caeiro
 
XXIV - O que Nós Vemos
 
 
     O que nós vemos das cousas são as cousas.
     Por que veríamos nós uma cousa se houvesse outra?
     Por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos
     Se ver e ouvir são ver e ouvir?

     O essencial é saber ver,
     Saber ver sem estar a pensar,
     Saber ver quando se vê,
     E nem pensar quando se vê
     Nem ver quando se pensa.

     Mas isso (tristes de nós que trazemos a alma vestida!), 
     Isso exige um estudo profundo,
     Uma aprendizagem de desaprender
     E uma seqüestração na liberdade daquele convento
     De que os poetas dizem que as estrelas são as freiras eternas
     E as flores as penitentes convictas de um só dia,
     Mas onde afinal as estrelas não são senão estrelas
     Nem as flores senão flores.
     Sendo por isso que lhes chamamos estrelas e flores.

 
 
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