Alberto Caeiro
 
XXXIX - O Mistério das Cousas
 
 
   O mistério das cousas, onde está ele?
   Onde está ele que não aparece
   Pelo menos a mostrar-nos que é mistério?
   Que sabe o rio disso e que sabe a árvore?
   E eu, que não sou mais do que eles, que sei disso?
   Sempre que olho para as cousas e penso no que os homens pensam delas,
   Rio como um regato que soa fresco numa pedra.

   Porque o único sentido oculto das cousas 
   É elas não terem sentido oculto nenhum, 
   É mais estranho do que todas as estranhezas 
   E do que os sonhos de todos os poetas
   E os pensamentos de todos os filósofos,
   Que as cousas sejam realmente o que parecem ser 
   E não haja nada que compreender.

   Sim, eis o que os meus sentidos aprenderam sozinhos: —
   As cousas não têm significação: têm existência.
   As cousas são o único sentido oculto das cousas.

 
 
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