E de delírio ...] ..................................................................... Ancião, não podes tu Arranjar-me um remédio para a vida? Quero vivê-la sem saber que a vivo Como tu vives. ..................................................................... Atordoar-me-á isto a alma toda, Toda, até dentro, muito dentro, velho? — Não teentendo], mas se é esquecer Que queres, bebe... — Quero, quero, vamos.... Esqueçamos-nos. Tens algo de mais forte P'ra] mais do que esquecer? depressa, diz... — Mal te compreendo, mas não tenho. ..................................................................... (FAUSTO bebe sofregamente) ..................................................................... Estranha e horrível criatura! ..................................................................... Não é vício Nem crime, nem tristeza, nem pavor Propriamente pavor, o que obscurece Como uma escuridão de dentro d'alma Toda a vida e expressão de sua face. E essas palavras de que usou — "esquecer A vida"; "mais do que esquecer"; "em mim Acabará então parte de mim" — Que significam? Não sei, mas sinto Que condizem, secreta e intimamente, Com esse íntimo ser que eu não conheço; Qualquer que seja essa desgraça, estranho, Dorme e ou esquece ou aconteça em ti Isso que semelhante ao esquecer Desordenadamente me disseste Desejar no teu íntimo... Dorme, e que o filtro opere no silêncio Da tua alma obra interior de paz E ao descerrares para mim os olhos Eu lhes veja a expressão já transmudada Para compreensível e humana Expressão de um humano sentimento. Te adormeça a existência intimamente E ao escuro desejo que tu tens. (Vai para o levantar mais retrai-se) Não; dorme onde caíste ... ..................................................................... Eu sou outro que os homens, ó ancião, O teu filtro de paz e esquecimento Não me faz esquecer e só a sombra De uma possível paz me entrou na alma. Para a paz que eu queria, isto que tenho É como archote para a luz do sol. Intimamente nada se passou. Paralisaste em mim a engrenagem Do pensamento e sentimento antigos ..................................................................... Não tornaria, eu sinto-o, a sentir O que sentia antigamente. Foi-se Não sei como o interior do meu ser Com suas intuições, mas não se foi A memória terrível do horror Da minha vida antiga ...] ..................................................................... ............................ Não fales mais. Eu vou... (pondo-se em pé) Eu vou, não sei aonde ... Como ...] treme, Com que debilidade e sentimento De estarmudado] o corpo todo. Velho, Adeus; quisera ter achado em ti podia ter achado. nada valem. Eu Deveria ao pedir tê-lo sabido; Mas... Não tens outro, diz-me... Tu que filtras venenos mais subtis Para a existência? ..................................................................... — Há um filtro Diferente daquele que tomaste; Diverso na intenção com que obra n'alma, Mas parecido no fazer esquecer. — Como diverso na intenção? — Em vez De apagar extinguir], adormecer, Faz — com terrível excitar de vida — Nascer n'alma um conflito de desejos Um desejo de tudo possuir, De tudo ser, de tudo ver, amar, Gozar, odiar, querer e não querer, Reunir vícios e virtudes — tudo Como que na ânsia férvida dum trago Da taça do existir. ..................................................................... — Tu vendes-mo... Ah! não, que eu nada tenho Nem sei se tive ou poderia ter. Tu dás-mo, velho. Não te servirá De nada ...] ..................................................................... ..................................................... Quem o fez? Por que o fez? Onde o tens? Repete mesmo O que de seus efeitos me disseste... ..................................................................... Que me decida ou não a beber dele, Esse filtro que a ti] de nada serve Dá-mo, pois. — Não to dou. — O filtro, velho. Não me enfureças, vá]; o filtro! — Não to dou. — O filtro! — Não to posso dar. — O filtro... — Para que avanças? Eu que mal te fiz? — O filtro; dá-me o filtro. — Mas não posso — Velho, repara em mim. Há na minh'alma Uma ira calma e fria! Foge que ela Na ação te mostre o que é. — Não posso dar-te. Em verdade to digo, o filtro. Eu Fiz-te o bem que pude; porque então Avançando assim calmo para mim No horror de qualquer outra] intenção Te vejo o mesmo sempre. Poupa-me isso Terrível que há em ti e que não trais Em movimento ou vaga intimidade Do olhar... Piedade, piedade... Piedade, senhor!, Eu dou-te o filtro, Eu dou-te o filtro. Piedade, eu dou... (FAUSTO estrangula-o ...]) (após matar) Nem sinto horror, nem medo, ou dor, ou ânsia, Nem qualquer forma] de estranheza sinto Pelo que fiz por mais que tente querer Sentir ...] ..................................................................... É uma alma morta ante um corpo morto Compreendo bem o que sentir eu devo Mas não consigo mesmo imaginar-me Sentindo-o ...] ............................................ quanto é de horror A morte, um ente morto, e o mistério Disto tudo. Sim, sinto-lhe o mistério... Mas este sentimento de mistério Não se me liga a um sentimento Que una] esse corpo a mim, que fiz O que de misterioso está ali. Tremo ao sentir quanto é mistério a morte... ..................................................................... Procuremos o filtro ...] ..................................................................... Uma calma d'amor...] sobre o meu ser, Como o luar sobre um lago estagnado... ..................................................................... Dize: Fazei feliz a quem eu amo, ..................................................................... Cujos olhos não choram por não ter Na alma já lágrimas para chorar; Que tendo erguido o seu pensar ao cume Do humano pensar.... Não, não importa, Não digas nada, reza e que a tua alma, Compadecendo-se de mim, encontre Os termos, as palavras que na prece Murmurará... Choras? Fiz-te chorar? — Sim... Não... Eu choro apenas de te ver Triste ...], sem que eu compreenda Tua tristeza, meu amor. Vem ela De alguma dor — oh, dize-me! partilha Comigo a tua dor, que eu te darei O meu carinho, porque te amo tanto... — Tu amas-me, tu amas-me, Maria? — Ah, tu duvidas? Meu amor, duvidas? ..................................................................... ................................ Se te amo, por que hás de Tu duvidar de mim? Ah, se palavras Podem levar a alma nelas, Fausto; Se o amor, este amor como eu o sinto Pode dizer-se sem o duvidar; Se o que eu sinto em minh'alma se] te vejo, Se sinto o teu pavor, quando penso Em ti, amor, em ti; se olhares, beijos, Podem mostrar o amor, todo o amor — Crê, que as minhas palavras, os meus beijos, O meu olhar têm esse amor. ..................................................................... Eu não sei dizer mais; não aprendi Como o amor falar, não ...] aprendi Porque o amor não fala e] não pode Dizer-se todo, senão não seria Amor ...] ..................................................................... Mas eu amo-te, Fausto! Ah, como te amo! ..................................................................... (à parte) — Aquilo é amor... eu, pois, nunca amarei ..................................................................... .............................. Não posso Fazer erguer em mim um sentimento Que dê as mãos àquele. E, de o não poder, Eu mais frio me sinto, mais pesado N'alma, na minha desconsolarão. Como me sinto falso, falso a mim...] Falso à existência, falso à vida, ao amor! (alto) Perdoa, amor... (à parte) Amor! Como me amarga De vazia em meu ser esta palavra Como de isso assim ser me encolerizo! (alto) Perdoa, meu amor! Cedo aprendi a duvidar de tudo Por duvidar e mim, sem o querer, Sem razão de o querer ou de o pensar ..................................................................... ................................. Mas eu creio em ti, Maria, Eu creio em ti... Como és bela! Não, não chores Quero falar ternura e não o sei. .................................................................... |