Concretismo
Contra os subprodutos
(in O Globo, 08.12.96)
Talvez já seja tempo de dissolver as
polarizações que envolvem a poesia concreta, e que acabam por
transformar a maioria dos críticos em apologistas ferrenhos ou
algozes implacáveis do movimento. Se é fato que os concretos, até
por estratégia, convocaram a polêmica, hoje ela soa inócua e
anacrônica.
É óbvio que nenhuma adesão a um estilo
garante a priori a eficácia de um texto. Tão equivocado quanto
afirmar que o movimento é a negação tecnocrática da poesia é supor
que a modernidade habita apenas no concretismo.
A partir de determinado momento,
passou a vigorar uma espécie de burocratização da vanguarda, com
seus decálogos e prescrições - tudo, enfim, que remete à vocação
autoritária dos que se julgam a culminância da poesia universal, com
a subseqüente suposição de que não existe vida inteligente além (ou
aquém) dos seguidores ou simpatizantes da seita.
Por outro lado, há que se destacar a
qualidade da poesia de Augusto de Campos, a excelência muitas vezes
atingida por Décio Pignatari e Haroldo de Campos nas artes e ofícios
da tradução, o desejo renovador na leitura canônica da poesia
brasileira, mesmo ao preço de se misturarem ulhos com bagulhos (vide
a hipervalorização de Sousândrade e a certeira redescoberta de Pedro
Kilkerry). Desagrada-me a profusão dos miniDécios, microHaroldos e
subAugustos que o movimento produziu (e fomentou) à exaustão.
Agradam-me os que, embora formados à beira da base concreta,
conseguem homenageá-la através de uma poesia que - cada vez mais -
cada vez menos lhe é devedora.
Carlito Azevedo, por exemplo.
ANTONIO CARLOS SECCHIN é autor
de "Poesia e desordem"
|