Heleno Godoy 

O Poema
 
não encontra seu próprio caminho
entre pedras, nem em estrada lisa,
regular, facilitada. O poema
pena um caminho errante, como estrela
que vai nascer no céu, certa, esperada,
mas a surpreender sempre, pois vem
naquele minuto em que se desvia
o olhar: antes não está lá, agora
brilha, vinda não se sabe de onde.
Uma estrela acusa um lugar, um sonho.

O poema não ousa um abismo
sozinho. Antes, joga pontes, cordas,
compõe uma passagem e um rito, 
recupera um processo, estabelece
uma forma, funda-se com força
de haste de junco, asa de incerto
inseto; com a fragilidade e a
insegurança de um mamífero
abandonado: agressivo se
faminto, dócil se acariciado.

O poema assegura ao que é selvagem
uma técnica precisa e adestrada;
desnuda o homem já despido, asse-
gura ao homem vestido uma chama
de reverência, o silêncio de espelho
crédulo, o vazio de uma multidão
seguindo firme e compassadamente.
O poema sabe ser inexorável
como a duplicação de estrada reta:
segue inalterado, sem fim, ser vivo.

 
 
[ Poema extraído do livro Trímeros - Goiânia, 1993 ]
       

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Página editada por  Alisson de Castro,  Jornal de Poesia,  02 de dezembro de 1997