Judas Isgorogota


Os que Vêm de Longe

Vocês não queiram mal aos que vêm de longe, aos que vêm sem rumo certo, como eu vim; as tempestades é que nos atiram para as praias sem fim... Os que vêm de longe, os que vêm famintos, os que vêm rasgados de dar compaixão, os olhos parados, os pés doloridos, pisando saudades calcadas no chão... Vocês nunca souberam o que é tempestade na vida de um homem... e nem saberão! É a seca na mata... é o mato rangendo, é a terra tostando, virando zarcão... É a gente morrendo na estrada vermelha vendo trapos humanos lutando com o pó... E as levas se arrastam penosas na estrada, enchendo as estradas de angústia e de dó... É a gente, sentindo tonturas na alma, piedade divina dos céus implorar, e ver que somente uma gota nos brota dos olhos cansados de tanto chorar... É o gado morrendo de fome e de sede, morrendo e mugindo num doido clamor, e a gente morrendo de sede, e sonhando... — a gente tem mesmo de ser sonhador... — sonhando com água, que ao menos o gado liberte da angústia da sede e da dor... E os trapos humanos se arrastam rezando, caindo, chorando, sofrendo e clamando por Nosso Senhor... É a gente ter nalma esperanças e sonhos, viver da ventura dos olhos de alguém, um dia encontrar a palhoça deserta e saber que, faminta, arrastando-se além, aquela que amamos a leva maldita levou-a também... É a gente sofrendo de ver a desdita sorrindo dos homens... Olhar para o céu, fechar a palhoça e sair pela estrada, sem rumo, sem nada, dos ventos ao léu... E o céu lá em cima piscando de quente... Lá longe a palhoça ficou, triste e só... Um fiapo de nuvem vem vindo... vem vindo... e a gente vai indo com os olhos na nuvem, os pés escaldando na areia e no pó... Depois, já se sabe... Depois é isso mesmo ... a gente vem vindo, tal qual como eu vim, sem Deus, sem destino, sem sorte, sem nada, até dar à costa num mundo sem fim... Vocês não queiram mal aos que vêm de longe, rasgados, famintos de dar compaixão... os olhos na terra ... os pés doloridos... pisando saudades calcadas no chão ...


* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *