Luiz Augusto Kehl

Remetido por: Marcelo Coelho - mpcoelho@uol.com.br

Tintim

Entre a noite e a aurora, nalguma hora em que vaga a mente e vê o que foi sem ter sido, noutras noites, a bordo daquele cargueiro rangente, na Filipina distante, ou nalgum porto, no Pacífico imenso, pedras do calçamento molhado rebrilhantes à luz da lua, meandros de ruas e casas à fraca vela dos postes, ninhos de putas às portas dos bares em que nunca estivemos, sombras e luzes e o girar lento das palmeiras e das pás de vento pendentes no teto descansando, banhando-se nas fímbrias e nas réstias de luz por entre cortinados de bambu, e a fumaça de milhares de cigarros vagabundos misturando-se aos perfumes molhados da selva e das veredas tropicais sob as estrelas; e embarcávamos resolutos nalgum navio de ferro e homens suados em que não fomos tatuados de amor e morte entre calados sábios papagaios, sinais de rádio e de telégrafo, carcaça balouçante entre as ondas e o praguejar do cozinheiro, relâmpagos e trovões oceânicos rugentes sobre os lamentos cavos das vagas a nos tragar e a nos vomitar um dia nas calmarias e no sal do mar, a nós inebriados do sal lambido dos sovacos das cadelas das bairas dos cais a naufragar-nos dentro da goela macia da baleia, entranhas de mobydick e matahari, sexo dos contrabandistas e dos piratas e nada além de uma página de pergaminho virada encharcada coberta de nada, e significando tudo.


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