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Página atualizada em 02.07.2000
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Lucília de Almeida Neves
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    Poesia telúrica e sensual 

    JARDIM DO TEMPO
    Lucília de Almeida Neves
    Editora Del Rey, 92 páginas
    R$ 13

     CARLOS HERCULANO LOPES
    (in Jornal do Brasil, Idéias, 1.7.2000)
     
     

     Foto de Divulgação
    [Lucília de Almeida Neves]

     A poesia mineira, de uns tempos para cá, andava meio parada, ou sem querer sair do fundo das gavetas. Ao contrário da ficção, que em fase efervescente revelava ao país romancistas como Antenor Pimenta, com O último Aurélio ou o Cadáver adiado, que saiu pela Rocco; João Batista Melo, com Patagônia, também pela Rocco; Luís Giffoni, com Tinta de sangue; Ruth Silvano Brandão, como Para sempre amada, editora Sette Letras; além de Roberto Drummond, ainda colhendo os louros de Hilda Furacão, mas já se preparando para lançar O cheiro de Deus. Também Jorge Fernando dos Santos, e o premiado Antônio Barreto, estão com romances para sair.

     Enquanto isso, a poesia mineira andava em banho-maria. Ou melhor, parecia que andava, já que de uma hora para outra Jovino Machado lançou Disco, pela Orobó; Ester Maciel, pela mesma editora, saiu com Triz; Elizabete Gontijo publicou Em segredo, pela Sette Letras, além de Paulinho Assunção, que pela sua própria editora, a Duas luas, lançou Escreventes. Isto só para citar alguns, que estão fazendo uma poesia da melhor qualidade e honrando o gênero na terra de Emílio Moura, Henriqueta Lisboa, Murilo Mendes e Drummond, cujo centenário estará sendo comemorado este ano.

     Mas como Minas é uma terra que está sempre supreeendendo, a coisa não ficaria só por aí, e de uma hora para outra, para surpresa geral a cientista política Lucília de Almeida Neves, autora já consagrada nesta área, resolveu mostrar o seu lado poético, embora, em segredo, já o viesse exercitando há muito tempo, desde os seus tempos de adolescente em São João Del Rey, a sua terra. Lá, um tio famoso, o ex-presidente Tancredo Neves, não só lhe emprestava livros, como também lhe dava dicas de autores, que lidos e relidos, se tornariam fundamentais para a sua formação. 

    Talvez tenham sido as lições do tio (como ninguém ele sabia tecer, em silêncio, as suas estratégias políticas), que tenham ensinado a Lucília de Almeida Neves a também fazer poesia sem maiores alardes. Mas esperando a hora certa, após escrever e reescrever, de finalmente mostrá-la já pronta, lapidada e bela, como fez em Jardim do Tempo, lançado no semestre passado pela Livraria e Editora Del Rey, de Belo Horizonte.

     Em meados de 1998, tive a oportunidade de fazer uma longa entrevista com ela, para o Caderno de Fim de Semana, do Estado de Minas. Falou-se de muita coisa naquele dia: da política, que ela traz no sangue; dos livros; de São João Del Rey, que tão profundamente marcou o seu coração; do Brasil e suas necessidades, além de alguns de seus sonhos e projetos pessoais.

     Naquela tarde, na qual conversamos durante horas no apartamento onde vive no bairro da Serra, em Belo Horizonte, Lucília Neves, com impressionante lucidez e poder de síntese, discorreu sobre todos estes assuntos. E mais: respondeu, pacientemente, a cada uma das perguntas. Mas existia ali, também, uma outra pessoa que eu não conhecia: a Lucília Neves poetisa.

     E qual não foi a minha surpresa quando, terminada a nossa conversa, ela me mostra os originais de um livro, dizendo-me, modestamente, que gostaria que eu desse uma lida. Foi o que fiz. E nos dias seguintes, com um interesse e encantamento cada vez maior, fui me adentrando página por página, poema por poema naquele outro, fascinante e rico universo que Lucília de Almeida Neves, até então, trazia guardado. 

    Livro denso, de uma força telúrica e sensual que poucas vezes tenho visto, como em Jardim do tempo, com o qual a autora faz a sua estréia na poesia. Nele Lucília, que também é professora titular da PUC/MG, se mostra por inteiro, sem medo e sem reservas. Mas com força, sensibilidade e coragem suficiente para dizer, através de tão belos e bem elaborados poemas, que a vida sem a poesia realmente não vale a pena. Ler Jardim do tempo é ir ao encontro de uma escrita poética plena, sem artifícios e feita por quem, embora estreante, mostra que já entende do ofício.

     Carlos Herculano Lopes, jornalista e escritor, é autor dos romances Sombras de julho e o Último conhaque.

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