Leão Júnior


Tempo Tempo

certifique-se de que o tempo não goza, em seu cabedal, o saber de um tempo argüido: seu irônico juízo no que investiga retorna e o que investiga é retorno do que então se parodia do que então potencializa um saber examinar-se no outro que está do outro sem imagem conferida mas que pressupõe ao pôr radicais inexistências sob metódico senso de crítica e de raciocínio para então comprometer a base — seu fundamento — do círculo que vira dia que se vive sem teoria o que lhe permite ser tempo é não contar sua história é não ter sequer história é ser o avesso da história a própria falta — seu ser de insuportável sentido — satura de perdas a vida e a explode como história aí é preciso viver de sobrevida aparente nas sobras do apalavrado reconduzido ao vazio e nesta sede excluída do homem desprende-se o tempo demolindo o quê de si sobrevive em seus sistemas que permanecem percursos de quebras fendas rupturas são como um não-rio os afluentes do tempo (faz flutuar periódicas minas de água parada) que cai por brutas clivagens como evidências sem fala ou conflui estimulando econômicas miragens que precipitam o invisível nas influências do visto e trazem a forma adiante das margens que nos espiam sem olhar antecipando múltiplos fluxos sem rio é de poesia que o tempo se alimenta de sua força estratégica sua premente ameaça pois quanto mais fortifica com mais defesas desata e obriga ao tempo o adiante de formas desmoronadas obriga a viagem das horas às suas fronteiras perdidas a descobrir demasiados possíveis de não rendição mal começada a jornada chegam arquitetos do não tem o passado uma fome do retomo do que falta fome de raiz-além desse longo ignorado e rumina arruinando a forma não digerida tem a fome de uma espera por horizonte não vindo se morde o passo do onde se gera a fome do tempo enquanto rumina o presente escape por entre os dentes quando céu e terra se fizeram uno o grande tempo moldou todas as coisas de uma só vez aos homens transmitiu a técnica de não esperar nenhum posterior, absoluto ou relativo se pressupôs: a consciência das clepisidras e das ampulhetas desapareceu perderam-se as sucessões e os recortes irreversivelmente o grande tempo fundiu os homens na geografia do outro e já não houve marcas de propriedade e já não houve Estados quando céu e terra se fizeram uno o presente pôde ser lembrado os configurados do tempo marinheiros e megáricos na volta não viram a margem fazer porto no outro lado fazer com poucos relógios este contorno marinho por lençóis curvos de água canais de vida ou de linho (mil canais de travessia não chegam ao tempo visado se o ângulo em que se projetam não vaga em tua memória se não te apreendem no agora rasgos de incertos indícios) a paciência da tribo faz que dorme faz que sonhem seus conceitos vagos com cristais quase nada extrai da falta de origem ou fim a paciência da tribo retira-se do tempo com malas e bagagens e põe-se a salvo como duração e morte quase nada deixa de sua imprópria matéria sem horizonte indagado a paciência da tribo não se acaba talvez porque seu puro escape dispense o eterno como os cristais às datas no instante do bote o tempo masca não marcha como os cadetes do colégio militar a cobra-macha do tempo não bate os calcanhares que não tem nem se perfila ou bate continência a cobra-marcha do tempo apenas rumina o seu azul pairado sobre alas, sobre balas. no instante exato do bote a cobra do tempo fuma e o verde desfile dos passos para sempre passa como uma falta de ser se imagina desejada ou quanto a letra se quer mais lida se mais apagada a consciência propaga sua força de abafada que mal ultrapassa a falha escandaliza o que falta e perturba porque gasta a razão da ultrapassagem ao propagar o querer doutras forças sufocadas que mais apagadas se avivam como letras desejadas de uma escrita em que falta tua imagem recortada tua vida recordada Por um apagado de charge o único tempo é o tempo que fora de si inexiste como existe o que expulsa de sua reserva incontente expulsa do homem o ganho ou pior, contabiliza sua fome de um ser tempo de ter no tempo o seu prumo e este homem sem divisas quer do tempo seu insumo cobra incentivos e lucros por vida a mais de consumo mas o tempo acerta o trato desconhecendo o rumo quem rói de ti os fantasmas de que se cobre a razão lendo o antes da memória que escapa à imaginação que examina pela falta as marcas da contradição que ousa escritos vazios sobre raspas predatórias quem desconcentra a razão para firmá-la no instável como solta resistência que se faz tão maleável que nenhuma norma nova fixa a ferida da margem a tinta encarnada do teu manuscrito sem história se entranha na letra como palavra arrancada à traça se entranha em calar dobrado como história dos silêncios que a letra arranca aos pedaços desta carne de azurado a tinta dos manuscritos come a tua mão pesada com gratos garfos que vexam o menos papel do prato para abrir com suas chaves o trauma de novos achados escrevo palavras que calam o meu objeto é o tempo não fala mas guarda em si monumentos que sem vestígios abalam e o seu mudo testamento fende infinito o fragmento que age escrevo à margem do efeito leitor da ávida ausência que apaga e não consulto memórias meu dicionário é o átimo que indaga deixa se possível um oco para que o tempo arrebente tuas mordaças sem corpo o teu silêncio de ovo teu fio sem interior que tece os teus desenlaces com mordidas ou amarras famintas da tua nudez derrama o rigor do silêncio na veia oblíqua do novo os tempos geraram os tempos que geram de si os tempos que geram os tempos de novo como uma trama bastarda os laços de parentesco perdido no que se ligam tecem o mito e a fenda saber de que é feito o tempo desses tempos sem história é ter por familiares homônimos desconhecidos que no entanto evoluem no seu poder de expurgar incógnitas biografias nos interiores das bibliotecas o teu vizinho vive os anos vinte um de meia-idade atrás de ti parte uma galáxia nos interiores da rua cada palavra circula com reais multiplicados pelos becos mais dispersos das páginas encadernadas os interiores do homem iluminam as passagens o que eu digo não quero dizer como ele se diz porque se faz no que faço para não fazer-se a mim e cada palavra se choca com o que impõe seu dizer e cada palavra se corta por outras pontuações o que eu não digo se fala torcendo sons e silêncios cavando-se onde não há mais que prática discente e em seu próprio discurso de tempos pouco assertivos nada assegura ou aponta a voz que se pronuncia porque esta voz dispersa só pressente, mal envia o antiquário escreve à margem dos manuscriptos do xerox do software do fax o antiquário constrói a margem do presente arcaico nos meios margem que se desloca do olho e trafega sob os traços cotejados o antiquário cria passados de crônicas por escrever: tempos de re-produção compondo a ordem do avesso por artes a poesia recorta o sem-fundo da fala e desenha em negativo as massas do impercebido cria o desenho nas falhas da palavra retalhada e faz divagar entre as formas o que escapa à razão o que lhe permite se abrir sempre que um fim se imagina e mais se faz desdobrar-se desdobrando suas divisas estas fronteiras que o homem mais pressente que imagina neste momento mais o tempo se nega ao discurso e por mais que o mapeie não tem verdadeiro tamanho então é preciso faze-lo relativo e problemático como um conceito que pensa a história escapada então é preciso vivê-lo como diferença e fado e mais preciso explorá-lo alargando os seus cavados este prático sondar impede a topografia mas concreta de paisagem que se alarga além do olho com cores que passarão a fazer parte da fala todo o tempo que conceder refúgio a dado estrangeiro no preciso objetivo de ocultá-lo à história será por ela acusado de crime de leso-oficio e portanto renegado (como poesia)

* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *