Luis Germano Graal


Quem Nasceu Vendedor de Peixes

Quem nasceu vendedor de peixes Vende peixes Não enjoa de vender Em verdade Peixes lhe aparecerão Tal e qual Aparecem fantasmas Nos castelos dos países no norte Quem nasceu Pra navegar Não sossega Não fica quieto Não esquenta lugar Não dorme direito Fora da linha do mar Nós nascemos para navegar A vida inteira Não adivinhamos Nosso vero destino Alguns de nós zanzaram Pelas ruas A pedir esmolas A roubar nas feiras A rolar pelas calçadas Mas nosso destino era Navegar Outros de nós Tiveram dinheiro E os estrangeiros nos tiraram O dinheiro que tivemos Tiraram-nos a vontade A visão Talvez as pessoas que assim fizeram Soubessem (Sequer sabendo Que sabiam) A verdade sobre nosso destino E apenas seguiram Os desígnios Outros de nós fomos depravados Fomos prostitutas Muitos fomos chamados De escória Pelos ainda terrestres Muitos escreveram versos Escrevemos autos Cartas Poemas Mas nenhum de nós sabia Do nosso final Desde o dia Em que nos puseram Nesta nave, navegamos Navegamos Navegamos Nossa vida é navegar Nosso destino Missão As quiromantes sabiam As videntes dos circos Sabiam Os oráculos, idem As pitonisas sabiam Mas não nos disseram Uma única palavra Os marinheiros também Deviam saber Um marinheiro reconhece Outro Mesmo na selva Mas nada nos deram (Tudo é segredo Tudo ainda é Segredo Nada nos é revelado) Nós Habitantes da nau Passamos nossa vida a saber De nada Nada nos é dito Tudo nos é escondido Tudo nos é roubado Tudo acontece Para que cumpramos o destino De navegar Mesmo quando No oceano pleno Estamos E não há um só navio Uma numa embarcação A vista É-nos sonegado saber Por que estamos Nesta nave Pois navegar é bom Mas temos fome Navegar é bom Mas temos sede Navegar é bom Mas temos frio Navegar é bom Mas temos sono Navegar é preciso Mas estamos cansados Estamos cansados Estamos cansados Navegar é viver Mas estamos quase mortos Navegar é o que nos resta Mas não queremos Navegar E nossa missão Mas que vá para o diabo Para o diablo Para as profundas A nossa missão Estamos aqui Marítimos Mas não queremos estar Nem todos de nós Queremos Estar Muitos querem ir embora Dois já foram Um com a sereia E o primeiro Com outro peixe Mais da nossa metade Junto à amurada Junto ao muro Junto à fronteira Do mar Está A fazer últimas orações Para eles chegado o momento O porto A pedra Já começam a cair Começam a se jogar O mar que era calmo Faz marulho Agora Ao engolir os corpos De nós Que caímos Os corpos de alguns De muitos Caídos No mar tanatificado Maktub?

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