Moreira Campos
Carta a Higino Rolim Neto
Caro Higino Rolim:
Li o ZÉ PESADO E OUTROS CONTOS com
muito interessa. Estilo vivo, palpitante, direto, claro. Erudito (se
esta é a expressão), quando a palavra é do autor; popular, com muita
fidelidade, quando a palavra é do homem do povo, notadamente
pescadores do Icaraí, Pacheco, Iparana e outras praias. Diga-se, de
logo, da beleza com que, em determinado trecho, você descreve a dita
praia de Icaraí, seu mundo de inspiração. Também tenho ali uma casa,
a de número 20, logo após a curva da avenida que passa na lateral da
atual Delegacia e Polícia. Chegamos ali, eu e os meus, em 72, quando
a praia era bem mais pura e se viam estrelas. Tanto que lhe dediquei
um poema que terminava assim:
À noite,
olho para o alto,
pulverizo-me em luz
e sou traço-de-união
entre o Infinito e o Eterno.
Mas voltemos a você. Toda uma vida
bancária, pelo menos até o belo conto A VERDADEIRA HISTÓRIA DE AMOR.
Remembranças, memórias, autobiografia bancária, em que se misturam
os Zés Pesados e os Chicos Finos, estes com mais vantagens, como é
óbvio, pelo puxa-saquismo.
Mas a verdade é que você foi, afinal,
o vitorioso, pela dignidade com que desempenhou a sua tarefa, pelo
escritor que é, o artista sensível.
Naquela primeira parte, tudo é Banco,
cujo símbolo, por sinal, inicia a palavra Pesado, na capa do livro.
A ficção propriamente dita, mas com muita verdade subjacente, se
inicia com o conto a que já aludi. Leilinha é um mistério e uma
saudade. Traumatizada decerto, porque o primeiro homem não a soube
possuir. Você foi pai, foi mãe e, sobretudo, amante. Moça
aparentemente leviana, guardava no melhor de si a pureza. Uma figura
muito bem criada e envolvida pelo mistério de sua ficção.
No mesmo andamento ficcional (mistério
e verdade), NALDINHA, com a sua sutileza, O SEGREDO DO LUCAS, etc.
Meus parabéns. Seu livro, prende,
fisga-me, como o autor fisgava os peixes, estes às vezes de má
qualidade, bem diferentes de suas estórias todas muito boas.
Minha admiração e um abraço.
Assinado: Moreira Campos
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