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Atualizado em 19.01.01
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Soares Feitosa
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Maria Isabel Borja

Ensaio e crítica:

  1. Luz Mediterrânea, de Raul de Leoni
 
* Maria Isabel Borja é mestre em Literatura Brasileira pela PUC-Rio
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Maria isabel Borja
 
Poesia absolutamente livre de correntes 
 
 

LUZ MEDITERRÂNEA
Raul de Leoni
Org. Pedro Lyra
Topbooks, 178 páginas
R$ 18
[In Jornal do Brasil, Idéias, 20.01.2001]

Muito oportunamente chega ao mercado uma nova edição da poesia de Raul de Leoni, Luz mediterrânea e outros poemas, organizada pelo professor Pedro Lyra. Além de trazer de volta às prateleiras das livrarias a obra de um grande poeta nacional, a valorização de um autor cuja poesia mantém-se de pé por si mesma, driblando as ditaduras de estilo, é sempre digna de louvor.

Como o modernista Cassiano Ricardo, o poeta Raul de Leoni nasceu em 1895, poucos anos depois de Mário e Oswald de Andrade. Seu primeiro e único livro, Luz mediterrânea, foi lançado em 1922, coincidindo com o ano da Semana de Arte Moderna. Nada disso, entretanto, influenciou-o o bastante para fazê-lo renegar a estética clássica ou impedi-lo de, em 1919, dedicar a Olavo Bilac, o nosso príncipe do Parnaso, tantas vezes injustamente crucificado em nome da estética modernista, a belíssima ''Ode a um poeta morto''.

Ainda assim, a indisputada qualidade da poesia de Leoni passou acima das controvérsias de estilo e foi igualmente aplaudida por parnasianos, modernistas, simbolistas e representantes de todas as correntes que fizeram a espécie de convulsão artística e intelectual que dominou as primeiras décadas deste século passado. Contudo, mesmo tendo obtido relativo êxito editorial e conquistado lugar cativo na memória do meio literário, Leoni não se salvou inteiramente da obscuridade que costuma envolver os que preferem dedicar-se serenamente (para usar uma palavra da predileção do poeta) à construção da própria obra do que afiliar-se a uma escola. Para quem, na seara da poesia, limitou-se a seguir as recomendações dos professores, Raul de Leoni é, em geral, um nome desconhecido, uma vez que não representa um estilo de época e, muito menos, o estilo eleito pela modernidade. E, certamente, não será leviano tributar boa parte da responsabilidade por lacunas dessa ordem aos programas escolares, mais preocupados em fazer com que o estudante decore e recite características de estilo de época do que em despertar-lhe o gosto pela leitura ao ponto de, talvez, decorar e recitar versos.

Não sendo exatamente parnasiano, por consentir-se uma liberdade formal mais próxima dos autores simbolistas, Leoni não chega também a alinhar-se com esses, dada a objetividade clássica de sua poesia. A melhor definição, se é que alguma pode dar conta de um verdadeiro poeta, talvez seja aquela encontrada por Rodrigo Melo Franco no prefácio à segunda edição de Luz mediterrânea: ''poeta das ideologias ou das abstrações.''

Trata-se de uma poesia onde a emoção nasce das idéias e idéias que, curiosamente, celebram antes o instinto do que a razão. Não se trata, como demonstra Pedro Lyra no ensaio que abre a nova edição, de poesia filosófica, obrigada à coerência necessária à defesa de uma tese; o que, aliás, seria fatal para a poesia. Há, sim, referências filosóficas, algumas vezes recorrentes, mas sempre apresentadas como imagem poética, sensação e desejo, da mesma forma que as personagens da mitologia clássica. Nesse sentido, Leoni parece cumprir o ideal nietzschiano, conciliando o dionisíaco e o apolíneo: ''Freme em tua arte o sangue de Dionisos, / Diluído nas virtudes apolíneas''. A título de esclarecimento para o leitor que nunca leu nada de Raul de Leoni, talvez ajude dizer que, se gosta do Alberto Caeiro e do Ricardo Reis de Fernando Pessoa, tem uma boa chance de apreciar muitíssimo a obra de Leoni.

A nova e bem-cuidada edição tem ainda a virtude de ajudar o leitor a penetrar na linguagem do poeta e a situá-lo dentro (ou fora) do universo literário de sua geração, guarnecendo-se de cinco estudos bastante elucidativos sobre sua poética: o prefácio de Rodrigo de Melo Franco à segunda edição da obra, o de Fernando Py, à 13ª, e os estudos de Assis Brasil, Franklin de Oliveira e do próprio organizador, Pedro Lyra. Merecem menção especial as observações de Fernando Py sobre as estruturas métricas utilizadas por Leoni, um aspecto técnico essencial a qualquer poesia e, no entanto, freqüentemente relegado a segundo plano pela crítica moderna.

Quanto ao texto principal, o livro reúne a ''Ode a um poeta morto'', poema publicado por Raul de Leoni em forma de plaquete (livreto de poucas páginas e aspecto gráfico elaborado destinado à circulação de uma obra curta), os poemas de Luz mediterrânea, transcritos a partir da 1ª edição, cotejados com outras mais recentes; ''Poemas inacabados'', cinco poemas publicados na 2ª edição de Luz mediterrânea, os quais teriam escapado à fogueira exigida pelo autor para aqueles que ficassem sem forma definitiva até o dia de sua morte; e ''Poemas avulsos'', nove publicados pela primeira vez no periódico Autores e Livros, igualmente salvos à fogueira. No conjunto da obra, a combinação de rigor formal, como estímulo à criatividade e não empecilho, e ousadia de imagens insuspeitas se encarregará de mostrar ao leitor que Leoni poderá ter sido mais profundamente renovador do que muitos dos que abraçaram as idéias modernistas sem chegar a compreender bem a linguagem poética.

Ao fim de seu estudo, Pedro Lyra promete uma edição crítica da obra de Leoni. Até lá, essa 15ª edição poderá já dar bastante prazer ao leitor não-especializado, para o qual talvez fosse mais urgente ver reeditadas outras obras poéticas de autores igualmente consistentes e, contudo, esquecidos pelos compêndios escolares.



* Maria Isabel Borja é mestre em Literatura Brasileira pela PUC-Rio
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