Gerardo Mello Mourão 
Estou com gosto de sangue na boca — disse
 
Estou com gosto de sangue na boca — disse 
Benedito, da raça dos Torres —
passamos todos a língua nos beiços e ninguém 
disse mais uma palavra e os cavalos reiúnos 
sumiram na poeira do Bebedouro — e tenho sempre 
esse gosto de sangue na boca e esse gosto 
de teu seio Sandra — e as éguas adolescentes 
desaparecem na praia rebolando as ancas 
e eu creio nelas — creio 
em Deus Padre e creio 
no rifle papo-amarelo e creio 
no mar salgado e creio 
na relva negra de teu triângulo, Sandra, 
e as irmãs mais velhas nos entregavam as irmãs 
mais moças
e as mães
ofereciam as filhas e este
foi o festim de amor de Luciana, filha de Dolores 
e de Susana, filha de Raquel 
e de Joana, irmã de Marilu 
and other females endin.g in ana e um dia 
o caboclo Otacílio procurou o coronel e queíxou-se: 
Amaro Florindo lhe desonrara a filha no caminho 
do Pilar
e recusava casar-se
e Amaro Florindo recebeu para ser cumprida
a ordem do Coronel:
pagasse o que devia à rapariga e durante 
dois anos certo de estar a moça casada o Coronel 
não vira mais a Otacílio — um dia apareceu 
e perguntado 
da sorte da filha da casada:
"Coronel, pois não casou" 
irado e poderoso levantou-se "
e a minha ordem a Amaro Florindo?" 
"Nós somos pobres, sabe Vossa Mercê, e ele me 
deu quinhentos mil réis pela honra dela" 
a voz do Coronel se fez macia: 
"e você ainda tem filha moça em casa?" 
"Duas, seu Coronel" 
e súbito, de novo, a poderosa voz:
"Mariana, traga depressa uma nota de um conto 
de réis e mande 
selar meu alazão".  E a honra 
dos machos e das fêmeas galopava 
à garupa de nossos cavalos 
e voltam sempre à boca esse gosto de sangue e esse 
gosto de fêmea 
e volta sempre ao coração a pura fé e creio 
em Deus Padre e creio 

o rifle papo-amarelo creio 
no mar salgado e creio 
em teu triângulo 
e ali
guarda em teu ventre guarda 
amor, em tua sepultura 
a raça dos Mourões e não me engula 
o mar salgado a negra nau 
a caminho de Delos

a caminho da de seio alvo e de cintura fina
a há de passar
do lombo de seu touro à sua coxa 
pétala à flor de seu umbigo à flor 
de sua flor: e aprendi 
a arte de pisar a flor 
pisa na fulô
ai pisa na fulô
não machuca meu amô e nem a brisa 
de teu sorriso apague 
o rastro de meu pé: 
por ali caminhei, Kyrina,
Angela derelicta Laura calipígia 
por ali, Mylène,
banhado nuns olhos verdes 
a caminho de ti, Sandra de Almeida, caminho 
montes de Vênus montes da Tessália 
e em tudo tenho parte: no cheiro 
de tuas virilhas e na morte de Robel —
Robel morreu como matava: 
quatro tiros na madrugada vide "Gazeta 
de Notícias"
Roberto Gomes Diamantino, o Robel,
chefe de quadrilha 
durante anos foi o terror de Madureira e 
adjacências
e foi encontrado morto de madrugada na rua
Alcobaça
com quatro tiros no peito 
e o principal suspeito da morte de Robel 
é Osvaldo 32, assim chamado 
só usava revólver 32 e Robel 
matara Valdecir, vulgo Viola, 
comparsa de seu bando
Viola lhe proibira namorasse a irmã
e com a morte de Robel, aos 19 anos, 
assume o comando o matador Paraíba
chamado Salústio ou Salustiano em Campina
Grande e Guarabira 
e Paraíba era temido pelo próprio Robel 
vide "Gazeta de Notícias" e nunca 
se defrontaram para acerto de contas: 
tenho contas
a acertar com Robel e Viola e Paraíba 
incidentes da viagem a caminho da Grécia 
onde Isabel e as outras assistiram 
o poeta perder-se e achar-se e adivinhar 
não há mais de um caminho para a Grécia 
e passa pela estrela de teu ventre 
e a bússola de um punhal do Cariri 
e água e fogo e ar no chão da Vila 
do Ingá do Bacamarte 
risquei no coração cartógrafo 
balisa natural ao norte avulta 
o das águas gigante caudaloso 
e no chão a alpercata de Apolo, Godo, 
e nas ondas o galeão 
de Pero Lopes de Souza 
e de seus bagos venho.

 

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