Subia Pero Lopes
o rio dos Beguaes e ali
dormem os homens
onde lhes anoitece
e são mui
tristes
o mais do tempo
choram:
suspiravam sempre
e não faziam modo
senão de
tristeza — e veio um dia
o farmacêutico
do Ipu, pois era, naquele tempo
o soluço
do capitão:
no silêncio
da noite
morto o eco do
relincho das éguas morto
o rolar do rio
nas ribanceiras era
da camarinha à
calçada da rua
o soluço
do Capitão: por quem soluçava ele
na noite de Ipueiras?
Antônio Soares
consultou o Lunário Perpétuo à
luz da lamparina:
Soluço —
suggultium — contração espasmódica, do
diafragma seguida
de dissensão, em
virtude da qual
o pouco ar que entrara
no peito é
expulso com ruído" —
e sobre o largo
peito sobre a hirsuta pele
a haste mergulhada
na garganta
tremia ao vento
da vila atônita
a flor de seu soluço:
por quem
soluçava
o Capitão?
Suggultium doridíssimo
rasgador de corações
que vinha do coração
e nunca do diafragma:
em silêncio
o rio a brisa
e o gramofone da
sala.
Por quem, fixos
nos meus os seus olhos azuis
transida neles
a face que hoje
tenho e transidos
nos olhos do menino
o olhar das que morreram
das que iam morrer
de seu amor
da que ao doce
veneno deste amor
na morte gota à
gota degustada
morria de não
morrer:
por mim por ti
por quem
suggultium amarum
in ainaritudine
amaritudo mea amarissima
por quem, boticário
do Ipu,
olhos fixos nos
meus
três dias
e três noites
na noite de Ipueiras
soluçava
o Capitão da raça dos Mourões
naquele tempo?
Causa mortis de
meu avô: — soluço — suggultium
firmava em latim
o boticário do Ipu: naquele
tempo,
tempo de Alexandre
e Cascavel
segundo os reis
eclesiásticos
encontravam-se
na Capitania
9.371 fogos
com 34.181 pessoas de desobriga
e eram vilas freguezias
capelas fazendas de criar e
engenhos de fabricar
o mel a rapadura a
aguardente
e pelos fogos e
suas pessoas de desobriga
soluçava
talvez o Capitão —
pela cana-crioula
pela cana-caiana cana-fita
cana-rosa cana-preta
cana-bambu cana-cabocla
carangola
cana-bourbon cana-de-cuba
flor-da-flexa
pelo engenho baixeiro
que não canta mais
na gitirana em
flor algemada a almanjarra
pelo cocão
partido pela ossada dos bois
pela rede no alpendre
pelas
ancoretas de aguardente
pelo
jumento morto no
terreiro
e a filha inupta
e o rifle pendurado
por Pedro morto
à faca e Alberico à bala
por Francisco enterrado
aos oito anos
pelos vivos pelos
mortos
pelo neto romeiro
e sua perdição sua invenção
ó pé-da-serra
dos Mourões ó lezírias e montes da
Tessália
do largo peito
ao coração do infante se partia
da partilha de
teus poderes o poder
de teu soluço
de morte
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