Gerardo Mello Mourão 
E às vezes tomávamos gin e Paulo Fleming
 
E às vezes tomávamos gin e Paulo Fleming 
ordenava o málaga negro e o Jerez de la Frontera 
e uma noite achei 
a estrela — e viva e fulva 
tremia sobre a fulva cidade
Agrigento!  Agrigento! — Raul 
desarrumou suas camisas e tirou do fundo da mala 
um rolo de cartolina:
"este es el mapa de la mina" —
e tirou um chinelo argentino de couro de bezerro: 
"que no lo sepa nadie, esta es la sandalia de 
Empedocles" —
e com olhos chineses sorria seu bigode negro à luz 
da estrela ruiva sobre a ruiva cidade
Agrigento!  Agrigento! e às vezes
Cristiano ordenava a cerveja neutra e Nelson 
Nelson Americano Freire ordenava o Black Label 
— outras vezes
a fome era ordenada e na Ordem da Fome 
professava o barão e professavam
Abdias, Tolipan, o judeu, Elias, o sírio, e surgia 
miraculado em sua nota de vinte mil réis 
Sebastião Milagre Rodrigues Alves 
e comíamos todos e eram dadas graças a Deus, 
às vezes graças a Antídio e a Rodoval e Rodoval 
fuzilara na praça de Ilhéus o rei do cacau por amor 
de Lalu e trocou
Lalu por Conceição e Conceição 
veio acabar-se na Pensão Imperial onde Emília 
regia a Lapa
numa firma de caftinas russas e francesas e onde 
servia Manolo, marechal dos veados 
e duas mil prostitutas e quatrocentos automóveis 
desfilaram em seu enterro no cemitério de São 
João Batista
e os bordéis da Rua Conde de Lage, com Raymonde,
Ginette, Luzia e Dolly e as outras se 
cotizaram
e um acadêmico italiano esculpiu o monumento e 
uma
dramática Magdalena de mármore enxuga com seus 
cabelos
os pés de um Cristo lânguido — e Manolo 
teria preferido sobre a cova — testemunha Vanda 
um grande falus de granito — e foram 
os funerais esses de Manolo maiores que os de 
Edgarsinho quando 
duzentos automóveis de bicheiros e bookmakers 
fizeram questão de ver o carro fúnebre com seu 
penacho negro
dar duas voltas completas na Praça da Bandeira 
antes que o belo cadáver do baleado en mala 
muerte
descansasse no cemitério do Caju: 
e adivinhara a morte de véspera 
e a saudara de joelhos no mosteiro de São Bento 
e tenho parte nessa morte e nessa vida eterna 
tenho parte a caminho de Agrigento
Agrigento! Agrigento! — e os de Agrigento perguntavam 
Agrigento?  Agrigento? — e a voz 
era de apelo ou de derelição — e a lira 
pendurada no cajado 
pastor hei sido por todo monte 
por tanto val zagal 
doze zagalo por este valo 
de lágrimas lavado o sopro da vadia avena ao vento 
verbena avenca valsa de avena
favo de mel full of sound
signifying no
THING
fury of no
THING
Agrigento!  Agrigento! — a fulva 
coma de teu casario e teus montes 
Agrigento!  Agrigento!  Vanda 
Vanda Moreno
com essa sandália de ouro 
zagal da vadia avena por seus vales 
eu vou às de Agrigento 
fugite fugite a gurgite vasto 
fugi de Agrigento!  E enquanto
Raul desarrumava a mala e Agustín desarrumava
Juanita,
Abdias, Efraín e Godo exclamavam:
Rachador da Estrela! achador da estrela!" — e a
estrela
queimava a mão
do filho dos Mourões — Agrigento!  Agrigento! je
mangeais
l'étoile — e veio o vício de comer 
estrelas fulgurantes: fulguravam às vezes no cristal 
e ardia bêbado o bebedor de estrelas
Agrigento!
Agrigento!
 

Laura Martínez sacudia as sandálias de esmeralda: 
foge, foge de Agrigento e da taça 
de estrelas espumantes onde as outras beberam 
o ignífero veneno — e nas entranhas 
de Clarice morta de morte violenta íamos lendo,
íamos, Dora,
as notícias da Grécia
vindas de Agrigento
e ficávamos todos espantados 
no meio do mar da banda daloeste em fundo
de vinte e cinco braças de areia tesa e súbito 
se faz à vela o galeão no rolo do mar, e é ali 
Agrigento, Agrigento com seus cavalos malhados 
e seus galos
de crista alta, e onde
entre as raparigas deitadas na praia 
comíamos em suas virilhas 
a orquídea e a estrela. 

 

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