Mário Pederneiras


Caminho Errado

(fragmento)


Eu preferia ter nascido Um pesado burguês redondo e manso, Alimentado e rude; Desses que vivem a vender saúde, Cuja vida, incolor e sem sentido, É um cômodo vale de descanso. Dos que da farta messe dos acervos Sentimentais, que lhes parecem fúteis, E o gozo de viver tornam lerdo, enfadonho Suprimem logo, por banais e inúteis, O Sonho, O Coração e os Nervos. E assim vazios, Só com o bem-estar e o asco Dos outros bens, que o ouro lhes trouxe, Vão por largos e plácidos desvios Seguindo a vida, qual se a Vida fosse A secular Estrada de Damasco. Sem perceber, nem distinguir aspectos De Luz, de Cor, que só parecem turvos A seus olhos parados; Que vivem como bem-aventurados E que se são internamente curvos, Nunca deixam de ser externamente retos. Felizes os que assim nasceram E que da Vida a perigosa aléia Percorrem toda sem um desaponto ... Viver assim... Sem Deus e sem Idéia, Ou ter um Deus que receberam pronto Idéias que os outros conceberam. A esses não estorva o passo, A almejada ração de uma alegria... Não distinguem a Cor do Sol e do Mormaço. E o Dia... é sempre o mesmo Dia.


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