Ricardo Reis 
Mestre
 
Mestre, são plácidas 
Todas as horas 
Que nós perdemos, 
Se no perdê-las, 
Qual numa jarra, 
Nós pomos flores. 

Não há tristezas 
Nem alegrias 

Na nossa vida. 
Assim saibamos, 
Sábios incautos, 
Não a viver, 

Mas decorrê-la,
Tranqüilos, plácidos, 

Lendo as crianças 
Por nossas mestras, 
E os olhos cheios 
De Natureza ... 

À beira-rio, 
À beira-estrada, 

Conforme calha, 
Sempre no mesmo 
Leve descanso 
De estar vivendo. 

O tempo passa,
Não nos diz nada. 

Envelhecemos. 
Saibamos, quase 
Maliciosos, 
Sentir-nos ir. 

Não vale a pena
Fazer um gesto. 

Não se resiste 
Ao deus atroz 
Que os próprios filhos 
Devora sempre. 

Colhamos flores.
Molhemos leves 
As nossas mãos 
Nos rios calmos, 
Para aprendermos 

Calma também. 

Girassóis sempre
Fitando o sol, 
Da vida iremos 
Tranqüilos,tendo 
Nem o remorso 
De ter vivido.


* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *