Sá de Miranda


Soneto

O sol é grande, caem coa calma as aves, Do tempo em tal sazão que sói ser fria: Esta água, que d'alto cai, acordar-me-ia, Do sono não, mas de cuidados graves. Ó coisas todas vãs, todas mudaves, Qual é o coração que em vós confia? Passando um dia vai, passa outro dia, Incertos todos mais que ao vento as naves! Eu vi já por aqui sombras e flores, Vi águas, e vi fontes, vi verdura; As aves vi cantar todas d'amores. Mudo e seco é já tudo; e de mistura, Também fazendo-me eu fui doutras cores; E tudo o mais renova, isto é sem cura.


* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *