Rodrigo Carvalho

Paisagem

à Cristina Pinchemel
Imagino que o dia está absolutamente perfeito. Pelo vidro suave da janela, o céu azul, resplandescente, ofusca qualquer pensamento vil. Nas ruas, as pessoas andam sorridentes e gentis, com ensaios de "bom-dia", "boa-tarde" e "boa-noite". Lá fora os ventos correm, — brincando! — como crianças num dia de sol, embaraçando cabelos, afagando folhas solitárias com suas doces carícias invisíveis... O mar, verde como uma floresta virgem, lança suas ondas de finas espumas sedosas, e a areia , — ah! a areia!... — com seus flocos dourados, assiste a tudo, inebriando-se... E sinto! Sinto a felicidade em mim, tomando conta de toda a minha alma, como se injetada por agulha fina, anestésica... E o ar brinca em meu coração, borbulhando todo o meu sangue, numa taça profunda, de cristal... O dia, aos poucos, vai desaparecendo por trás dos montes, — verdes como o mar! — dando luz e vida a uma nova criança que está por nascer... E a lua surge, completa, afiada, seduzindo estrelas e puros corações. Os vizinhos em suas varandas, prestigiam um novo espetáculo. E vão dormir felizes, preenchidos por um calor que emana de cada um, e com um misto de satisfação e ansiedade, certos de um novo espetáculo, que irá surgir pela manhã... A vida não tem sentido, se você não compõe sua própria paisagem...

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