Samuel Penido
A noite em Babylônia
Domingo 22 de agosto de 1999
Mais um livro de poemas de Artur
Eduardo Benevides: A Noite em Babylônia e Outros Relatos ao Eterno.
Mais uma aula de poesia do consagrado mestre cearense. E entre
tantas lições que não cessa de ministrar-nos, livro após livro,
duas, aparentemente simples, avultam: nobre, mas também árdua é a
arte poética, e há que exercê-la como se fosse uma missão.
Dessas linhas mestras Benevides não se
afastou em momento algum. Sua carreira iniciada nos idos de 40,
jamais se interrompeu, sendo um modelo de realização literária e de
iluminação para os amantes da poesia. E mais: de seus companheiros
de geração, a Geração de 45, são poucos, pouquíssimos mesmo os que
se lhe igualam em fecundidade e regularidade na produção. A Noite em
Babylônia traz-nos novamente o grande lírico às voltas com aqueles
temas que mais tocam o homem, os chamados temas universais, como o
amor, a morte, a natureza, o tempo e sua marcha fatal, tudo envolto
numa aura tão cálida quão nostálgica. Ao lado do cantor das "neves
de outrora", há a testemunha de um mundo em metamorfose contínua; ao
lado do exilado numa época de incertezas, que é a nossa, há o
portador de sólidas convicções estéticas e filosóficas.
Muito poderíamos dizer dos poemas que
compõem A Noite em Babylônia. Porém, é dos dois primeiros que iremos
falar, a saber: "Informe sobre as últimas ocorrências em Babylônia"
e "Segundo informe sobre as últimas ocorrências em Babylônia".
Trata-se de poemas de notável teor participante, nos quais o poeta
se aprofunda na contemplação de nebulosa paisagem que nos cerca.
Pelo que contêm de dramático e atual, hão de despertar certamente a
emoção e a reflexão do leitor, de modo especial.
Neles palpita aquele "sentimento do
mundo" a que se refere Drummond; neles, de forma nítida e lapidar, o
poeta aborda graves problemas que afligem o homem moderno, presa de
mil ameaças, da solidão, do medo, da desesperança.O clima elegíaco,
presente em boa parte da obra de Benevides, aqui ganha tintas mais
fortes. Torna-se apocalíptico. Um clima apocalíptico que já não
pertence ao terreno da futurologia, porquanto passou a fazer parte
do nosso cotidiano:
"Dormitam, junto a nós, ogivas nucleares
e falsos profetas erguem novos altares.
Aumenta, dia a dia, o riso de Satã,
sobre o lombo de fogo de Leviatã".
[...]
"A solidão é voraz. Na noite se refaz.
E procuramos, tontos, em tudo o que fizemos,
o endereço do eterno, que perdemos."
Metaforicamente, o poeta descreve a
noite em Babylônia. E sua voz ressoa mais viva e incisiva do que
nunca:
"Meia-noite em Babylônia.
E todos, temerosos, com insônia,
comem os grãos de sua solidão.
[...]
Os seres e as cousas escurecem.
E ouve-se, bem perto, entre estranhos rumores,
o teclar incessante dos Computadores."
Os trechos acima mostram, claramente,
como nos "informes sobre as últimas ocorrências em Babylônia", o
poeta soube mobilizar toda sua consciência histórica, revelando,
ademais, uma aguda preocupação com a sorte da humanidade.á quanto ao
conjunto da obra, cumpre lembrar certos elementos imanentes ao texto
do Autor, ou seja, o apuro melódico e o absoluto domínio dos
recursos imagéticos. Além disso, é realmente de impressionar a
eficiência com que maneja a língua; é de encantar a intimidade que
tem com a palavra poética.
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