Santa Rita Durão


Caramuru

Canto II

XVII
Não era assim nas aves fugitivas, Que umas frechava no ar, e outras em laços Com arte o caçador tomava vivas; Uma, porém, nos líquidos espaços Faz com a pluma as setas pouco ativas, Deixando a lisa pena os golpes lassos. Toma-a de mira Diogo e o ponto aguarda: Dá-lhe um tiro e derruba-a com a espingarda. Estando a turba longe de cuidá-lo, Fica o bárbaro ao golpe estremecido E cai por terra no tremendo abalo Da chama do fracasso e do estampido; Qual do hórrido trovão com raio e estalo Algum junto a quem cai fica aturdido, Tal Gupeva ficou, crendo formada No arcabuz de Diogo uma trovoada. Toda em terra prostrada, exclama e grita A turba rude em mísero desmaio, E faz o horror que estúpida repita Tupã, Caramuru, temendo um raio. Pretendem ter por Deus, quando o permita O que estão vendo em pavoroso ensaio, Entre horríveis trovões do márcio jogo, Vomitar chamas e abrasar com fogo. Desde esse dia, é fama que por nome Do grão Caramuru foi celebrado O forte Diogo; e que escutado dome Este apelido o bárbaro espantado. Indicava o Brasil no sobrenome, Que era um dragão dos mares vomitado; Nem de outra arte entre nós antiga idade Tem Joce, Apolo e Marte por deidade.


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