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Só a DIDÁTICA em prol do Homem legitima o conhecimento

Tânia Lima

27.2.2003


Laços de raízes e palavras

“Palavras caem/Nus mangues//desalinhadas/se envolvem//sobem o mar/emaranhadas”. Esta metalinguagem inicial é apenas um dos laços mágicos de “Nus Mangues”, poema-narrativo inédito de Tânia Lima, que recebeu mençãoTania, 2003, livro Brenhas honrosa na última edição do Prêmio Redescoberta da Literatura Brasileira, promovido pelas Revista Cult. Agora, a poetisa maranhense, autora de “Pedra do Sol” (1996), “O Livro do Abrigo” (1999) e “A Bela Estrãgeira” (2001), renova sua relação com esse ecossistema pleno em raízes, lama e vida, envolvendo-nos em novas sendas dos manguezais: “Brenhas - um poema”. O lançamento acontece hoje à noite, no Bar O Haroldão, no Mirante. E, como é quinta-feira e o tema sugere, a noitada literária será regada a muito caranguejo, como manda a tradição da cidade. No som, é claro, pode pintar um Mangue Beat...

Na “sina de lama”, a mimésis prossegue. “Nus Mangues”, o pescador “se arruma/para rima/encharca-se de húmus/ pesca sem vírgulas/palavra morde a isca”. Homem, rio, mar, palavra. Homem, lama, palavra. Homem, palavra. “Nus Mangues”. Pescador-natureza “alinhava o mangue”, os “garranchos embaralhados”. Mangue de raízes entrançadas, de arraias nuas, sururus, garças, piabas, corujas, caracóis, calangos e fábulas.

Mangue de homem. Do “limador de igarapés”, que atende aos acenos dos caranguejos. Que se mimetiza, feito lobisomem do sertão dos coronéis. Transfigura-se feito aqueles homens encantados dos Barros do Pantanal. “Enfiado na lama”, no “mundo de sangue”, entre as travessuras do rio, arrastadas (1 prego, 2 vidros, 3 latas de guaraná) ele, pescador, “pessoa sem pensa”, lembra da família, lembra de nada e, pouco a pouco, “descama”, “desbrinca”, sonha, descobre-se pássaro, “imita uma instalação”, em “pele de argila” e “beiço de origami”, encarangueja-se, enquanto a “palavra arrasta rio” e o poema, “texto úmido, encaracolado”, também vai virando mangue, correndo manso, viscoso, entre as águas dos olhos da gente.

Manoel de Barros vai ficar contente com a amiga. Na carta que serve de abertura a “Brenhas”, ele fez umas ponderações, puxão de orelhas encantado. “Ele diz que faltavam imagens, fiz muitas mudanças”, admite Tânia. “Vejo pouca transfiguração”, escreveu o “palpiteiro”. Puxadas também, as mãos de Tânia reescreveram um pouco de quase tudo, mas guardaram no prefácio as boas palavras do mestre das coisas sem “ignorãças”. Para se lembrar até sempre. Como também estão em “Brenhas” as cordinhas de barbante, que, se não são para amarrar os leitores, marcam as páginas e ajudam a nos envolver com o cenário. “É como se fossem as raízes e os cipós dos mangues”, enlaça a escritora dos encantos de Barros.

O mangue e a poesia de Tânia se reconhecem desde “Pedra do Sol”, estréia da poeta, há sete anos. Faz parte de seu interesse contínuo pelas cascas sociais, diante da efemeridade da condição humana, transposta por uma corrente de interpretações e semânticas agudas, inquietas e lacônicas, entre poemas concretos, secos e poemas mais úmidos, profusos, como sua “Carta para o silêncio”. Poesia de gente grande, que atropela as grades e as redes da vida. “Se entrasse dezembro, íamos visitar nossos pais/Viajávamos à ilha de Igoronhon/Navegávamos rios de mares, ilhas de fábulas/entre mangues de peixe”, contou a maranhense.

Em 99, a menina da poesia de mar grande somava novos elementos à sua relação com a “Terrabalada” (lembrando uma de suas referências, Sílvio Roberto de Oliveira) transbordando, na introdução do “Livro do Abrigo”, o ninho ainda mais acalentado das palavras: “Nasci na beira do mangue. A primeira vez que li, apanhei de palmatória porque não sabia soletrar a palavra floresta. O mangue era minha floresta”. Entre momentos existenciais, míticos e referências a Quintana e Cego Aderaldo, eis o “Mangue”: “sem pressa caranguejos andam para trás/rios debatem nas pororocas/levam ribanceira/fazem o carnaval”...

“A Bela Estrãgeira”, premiado no IV Festival Universitário de Literatura, enredava, há dois anos, mais confissões: “Entre tardes, debaixo dos mangues/Ficávamos remendando os lundus”. E ainda, em prosa: “Nasci não faz muito tempo, na Ilha de Igoronhon - MA. Onde carreguei muitas palavras, tiradas do mangue e do sal. Gostava de andar descalça, no meio da lama, quase caranguejo. Atualmente, pesquiso ´coisinhas inúteis´ de Manoel de Barros no bosque de uma universidade. O resto está nos mangues”.

Também nos outros, Tânia foi encontrando mangues, percorrendo veredas de outras florestas. Além das baladas da “Vidamangue” de Silvio Roberto, a poetisa se vincula com versos perdidos de Ascenso Ferreira, de João Cabral; do “Sol sangüíneo”, do conterrâneo Salgado Maranhão, à prosa de doutor Josué de Castro e d´ “As mulheres de Tijucopapo”, de Marilene Felinto. Com parte desta turma, a moça pretende envolver-se em seu doutorado. É que a noite, além do lançamento de “Brenhas”, e das patinhas cabeludas dos caranguejos, reserva a despedida de Tânia, esticando suas raízes para a terra dos “Homens e Caranguejos”, no dizer de Josué, que foi referência também para o poeta Science e o pessoal da “batida” do Mangue.

Graduada em Letras, com mestrado pela UFC, Tânia vai para o doutorado, na UFPE. “Nossos regionalismos literários foram sertanejos, não brejeiros. Falta um olhar sistematizado sobre o cotidiano, a cultura dos mangues. Farei esse mapeamento, do Modernismo ao Mangue Beat”. Além dos autores citados, dos quais ela excluirá as obras em prosa, Tânia já tem referências nas obras de Raul Bopp e Joaquim Cardozo.

“Estudando os mangues, estudo também a minha obra”. Do mar das aranhas grandes, de “uma ilha que foi levada” por ele, Tânia viu os mangues do Piauí, de onde vêm aqueles seres saboreados todas as noites de quinta, todos os fins de semana de sol. Apesar do seu envolvimento com outras “terrabaladas”, segundo Tânia, os mangues de “Brenhas” são os cearenses. Foi por aqui que a menina se descobriu escritora, pronta para desvendar outras entranhas.

Artesanal, “Brenhas” chega em tiragem xerocada sobre papel jornal, com matriz impressa em computador. “Até a capa é xerocada. O que ia me custar uns dois mil e quinhentos reais, custou mil e quinhentos. Dá uns 500 exemplares, a qualidade é boa”. A técnica é conhecida, além das xerox dos trabalhos acadêmicos: “A Bela Estrãgeira” fora publicado através de um Prêmio da Xérox do Brasil. A capa, de Ticiano Monteiro, traz um objeto de Herbert Rolim, revitalizado dos mangues. E tem também os barbantes, as falsas raízes dos mangue brotando das páginas. Dentro, uma linguagem híbrida, versos de mangues metamorfoseados e imagens fragmentadas, como: “cumeeira de palha/estilo cipó/alegria de cupins/as ruínas falésias/mangue-sabiaguaba/fubebol na lama/batida de latas”.

Henrique Nunes - Da Editoria do Caderno 3

 

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José Alcides Pinto

LIVROS
Beleza e Sordidez

Vencedor do IV Festival Universitário de Literatura, concurso promovido pela Xerox do Brasil, A Bela Estrãgeira, da maranhense radicada no Ceará, Tânia Lima, será lançado hoje à noite na Quarta Literária do Dragão do Mar

José Alcides Pinto
Especial para o vida & arte
 
 

A maranhense radicada no Ceará tânia Limaque está lançando logo mais a Bela Estrãgeira: elogios de José alcides Pinto para versos como "Metáforas pelejam no subúrbio semáforos / testemunham" (Foto: Antonio Duarte 28/12/2000)

Tânia Lima entrega ao público e à crítica seu último livro de poesia - A bela estrãgeira (Grupo Editorial Cone Sul, São Paulo, 88 páginas, R$ ). A capa é uma reprodução de Leonardo da Vince (Leda) e o texto vem em papel reciclado, com ilustrações do talentoso artista plástico cearense, André Luiz, o que torna o volume mais bonito ainda. A palavra ''estrãgeira'', trocando o n pelo til, é idéia felicíssima de Solange Kate, professora de Literatura da UFC.

O livro lançado há pouco tempo, na Livraria Cultura em São Paulo, levantou, na categoria poesia do quarto festival Universitário de Literatura, o Prêmio Xerox do Brasil de Literatura. Tânia Lima dedica-o aos sem tetos, desempregados, meninas de favelas, prostitutas, lixeiros, etc., enfim ao todo
povo excluído do Brasil. Penso que a melhor apresentação que se possa fazer de Tânia Lima é ler os seus poemas. A autora é muito original e criativa em sua linguagem anticonvencional que reflete o mundo atual em seus conflitos e mudanças.

Percebe-se no texto a rebeldia das metáforas sinestésicas, dessa rebeldia de que se nutre a poesia dionisíaca, pois como diz Camus: ''Toda vida consciente é uma revolta.' E como diz a autora: ''Metáforas pelejam no subúrbio / semáforos testemunham.'

A angústia existencial fez dela nossa poeta predileta. Sua linguagem poética é ousada. Não temos notícias por essas bandas de outra que escreve igual a ela: como pensa, como quer, como lhe convém, quebrando tabus, destruindo, abrindo fendas na hipocrisia: ''Não me ensinaram a ser feminina / minha poesia está fora de forma / escola é sonho de virar gente/ sertanejo não fala português / as cousas não prestam pra falar''.

É uma poesia malina, uma menina grande de escrita travessa. Tudo nela lembra indisciplina, criança peralta, insubordinada, que rouba as palavras do dicionário e laranjas no supermercado. Não sou eu quem diz, está em seus achados bibliográficos: ''Quando fui estudar no Piauí - acrescenta ela -''disseram-me que eu precisava duma religião. Aí eu fiquei com o Deus dos proletários. Lá no meio do mato, escrevia à lua minguante. Minha mãe diz que eu tenho um juízo mole / Mas o que tem a ver um juízo mole com a lua minguante?' Vejam, nesse pequeno excerto, o paradoxo da intenção poética sendo alinhavado pela textura do signo da contradição. Observem também a beleza desse fascinante conceito: ''Poesia / é / árvore / que / se / planta / no arranha-céu''.

Quem atira a primeira pedra sem que esta não lhe caia na cabeça? Tânia Lima não tem medo das palavras nem de Virgínia Woolf, nem de Benjamim Taubkin. Pois como diz a autora: ''Pra disaprender / entra de chalana / desaparece / dentro da linguagem''. Eu não queria que esta apresentação fosse escrita, queria, sim, conversar com ela, olho a olho, à vista de todo mundo, para quem sabe ''lapidar com os lápis de cera os ouvidos do mundo''. Ah, como eu gostaria de saber onde se encontra a pureza, porque então iria buscar Tânia Lima intacta, de pé, no pórtico das catedrais, onde o anjo mora. ''O pai passeava de bicicleta com a filha, Mariana. / Foram se encontrar com o mar / Juntos encostaram a bicicleta na enseada / Enquanto a tarde se ia entre surfista / O pai escrevia notícias nas nuvens / Enquanto a filha desfolhava / a paisagem (com cuidado) / Lá pelas tantas ... / A menina aponta com o dedinho para o infinito. / Olha lá, paizinho, / o mar tá cheio de vrido.'

Confesso a você leitor (a) que poemas como este e tantos outros de A bela estrãgeira não se encontram do dia para noite, pois são poemas extemporâneos: ''Trazia um romance policial / Debaixo do braço esquerdo / Uma carteira de cigarro num dos pulmões / Uma bolsa cheia de palavrão / E um salário de fome / Dentro do estômago. Também não me posso furtar à curiosidade do que se seguem em nota de pé de página: ''Aluga-se / folha em branco / para poeta / desempregado.' Aliás esse poema devia ser endereçado a mim que já disse em um de meus livros: ''Não me arranjem emprego / Não criem obstáculos à minha vida.' Sabe-se que o tempo é de guerra e fome como tantos outros. Talvez por isso, a poesia mais do que nunca exerça sua função de nos fazer enxergar, além do óbvio, nessa bela estrãgeira que em verdade somos todos nós: vendedores de amendoim, povo excluído de um Brasil estrangeiro, brasil de mirins.

José Alcides Pinto é escritor
 

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