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Nilza Amaral
Em meus tempos de faculdade quando optei por estudar Lingüística, conheci a Semiótica e a Semântica. Daí para a loucura foi uma tênue e frágil linha que consegui ultrapassar. Conheci muitos autores tentando conceituar o ser e suas denominações. Falou-se até de uma tal de Lady Welby (1887-1912), que tentou implantar a ciência das significações através de frenética correspondência a respeito de suas teorias com os estudiosos do assunto. Alguns a levaram a sério entre eles Ogden e Richards que escreveram o livro The meaning of meaning (tradução literal: A significação do significado).Essa foi uma das primeiras tentativas de melhorar a linguagem, porém essa nova ciência ficou incompleta e desapareceu de vista até renascer no século passado. Há autores que tentam fugir da conceituação pré-estabelecida e criam um código próprio, correndo os riscos inerentes. Os escritores podem usar códigos individuais, como James Joyce que, em Finnegans Wake, desviou-se do uso comum da língua, criando uma língua especial e arriscando-se a não ser entendido. Quem assistiu o filme, na versão sem cortes e em inglês, pôde verificar a implantação de um código desconhecido. Na edição do livro, que foi publicado em português, havia um glossário para auxiliar na decodificação. Dos autores brasileiros, Guimarães Rosa inovou a literatura com seus neologismos e sua linguagem regionalista, tornado-se "uma leitura difícil". Umberto Eco, em Kant e o Ornitorrinco (título bem escolhido como frase de efeito), discorreu sobre esse assunto que vem atormentando os filósofos, escritores e estudiosos da palavra desde Platão e, através de histórias e fábulas, tentando deixar de lado as formas acadêmicas e partindo para o que ele chama de investigações, tenta conceituar o ser. Apesar da tradução apresentar falhas (o problema da significação e interpretação), apontadas por críticos, gostei de ler a obra. Diz Eco que Kant nada tem a ver com o ornitorrinco, apenas imagina o quanto o filósofo ficaria perplexo ao ver aquele animal que nunca chegou a conhecer e que possuía bico de pato, garras, olho de pássaro e botava ovos. Talvez tão perplexo quanto Marco Polo que, ao deparar em Java com um animal que ele nunca havia visto (que nós sabemos agora que era o rinoceronte), e o comparando a animais conhecidos distingue o corpo, as quatro patas e o chifre. Chega à conclusão, pela sua cultura, de que é um unicórnio, mas honestamente afirma estranhar esses unicórnios estranhos pois não são brancos nem ágeis, têm pêlos de búfalo, o chifre é negro e desgracioso, a língua espinhosa e a cabeça parecida com a do javali.
Freud afirmou que não acreditava na necessidade de definir a angústia porque todos deveriam ter experimentado, uma vez que fosse, essa sensação, ou melhor, esse estado afetivo. O que é afinal um ser, e como posso identificá-lo através de uma palavra? E a história, para que serve uma história? Sem querer entrar nas classificações eruditas, maçantes e enfadonhas, deixo os conceitos para os leitores que quiserem se aventurar por essa floresta espessa permeada pela angústia do não conhecimento.
Para confirmar essa minha assertiva,
deixo vocês com o poema de José Saramago, o mais recente prêmio
Nobel de literatura, que pela amostra prova que entende tanto de um como
de outro gênero.
FALA DO VELHO DO RESTELO AO ASTRONAUTA
Aqui na terra a fome continua
Acendemos cigarros em fogos de napalm
Só a fome, astronauta, só a fome. |
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