Antônio Mariano
Notas para um concerto amoroso
Há mais de uma década Linaldo Guedes é
parte da cena literária paraibana. Ignorar isto seria pecar por
omissão ou mesmo má fé, esse nome que é uma das peças necessárias da
poesia que é feita nesse estado pequeno e de tantos poetas por metro
quadrado. Referência como criador, como leitor e como animador, no
puro sentido da raiz ânima. De fato, para quem se desviar um pouco
do próprio umbigo, é difícil não lembrar de Linaldo, o grupo
Poecodebar, seus versos em textos sentidos (para se apropriar aqui
do belo título do nosso Lau Siqueira), suas leituras provocativas de
realidades externas e interiores impressas nas páginas dos jornais.
Agora nos traz um novo livro. Aqui, será o poeta um instrumentista
com atração para desconcertos da alma? Serão os amantes cantores
desentoados de uma ária cujo próprio tema é o desencontro? Sim e
mais que isso. A poesia como música, como defendia radicalmente Paul
Valéry, mesmo se tudo for traição de uma bela sinfonia. Neste
sentido, o poeta paraibano Linaldo Guedes parece confirmar, a seu
modo, a tal assertiva: “baby, quando a onda do mar traz o/sal da
vida em suas mágoas é porque/nenhuma /música melodia /o duelo/
desafinado/ dos adultos”.
Seguido de um lapso de seis anos desde a publicação de Os zumbis
também escutam blues, Linaldo retorna com esta coletânea que ele,
numa grande sacada batizou (com fogo!) de Intervalo lírico. Bem
definido o objeto a ser cantado ou decantado, à maneira dos
alquimistas no seu ofício de separar impurezas, o poeta se volta
para a fábula primitiva da relação a dois. Modalidade que, embora
comum, nem de longe é fácil levar a termo. Dividida em três
momentos, a obra funciona como um concerto amoroso dispondo peças
que contemplam o encanto, o lamento, a esperança... Tudo parece
depender de um calendário cortado pela peripécia dos heróis. Mas não
é uma era qualquer essa dos amantes. Ao contrário, como marcada pela
ira de Crono a devorar seus filhos, “é um tempo que violenta/a
ampulheta”.
Esse tempo e esse ritmo o leitor corre o risco de encontrar neste
livro. Mais que isto, se mergulhar sem reservas, haverá de encontrar
seu próprio pulso e com o poeta se identificar, posto ser nele, o
leitor, que a própria literatura se completa, como pretende nos
fazer concluir Riffaterre. À poesia, pois. O que mais interessa?
(Texto do poeta paraibano Antônio Mariano para a
Orelha do meu novo livro de poesias, "Intervalo Lírico)
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