Batista de Lima
A caçada
Primeiro
apareceu uma ovelha morta. A coitada estava sangrada no chiqueiro,
ao pé da cerca. Ainda estava morna. Foi só tirar o couro e
aproveitar a carne.
No dia seguinte,
outra apareceu nas mesmas circunstâncias. Só que, dessa vez, Major
Apolônio resmungou uma praga e partiu para a investigação. Pelos
rastros, viu logo que era onça, o bicho matador. Foi por isso que
vinte homens foram convocados para vasculhar a serra e matar a
criminosa.
Com suas armas
bem oleadas, os caçadores passaram o dia nas matas e não mataram
nada, mas trouxeram de volta os bornais repletos de histórias de
onça. Era um bicho alentado, beirando duzentos quilos, vermelha e do
lombo preto. Estava esfomeada e sangüinária. Foi por isso que dois
caçadores passaram a botar sentido no chiqueiro das ovelhas nas
noites seguintes.
A partir de
então, a criminosa começou a atacar o rebanho de gado. Era uma rês
quase todo dia. No domingo ensolarado havia oitenta homens no seu
encalço, e nada de onça. Só chegavam histórias gigantes de um bicho
muito mais. Já havia um prêmio estabelecido para o caçador que
trouxesse a bichana morta pros terreiros da fazenda: era um boi
malabar; criado no cabresto e avaliado em vinte arrobas de carne
muciça.
Apareceram então
caçadores dos mais distantes recantos. Até Tonho Saruê, da serra do
Quincocá, baixou acampamento nos rastros da comedora de garrotes.
Teve um domingo que havia mais de duzentos homens palmilhando a
chapada, e nada da lombo preto. O que havia de preá, mocó, jacu,
peba, tatu, raposa e tejo acabou-se nas redondezas. Já havia
histórias as mais divertidas de matadores de onça. Teve um que andou
a cavalo na desditosa e ainda trouxe uma trunfa dos cabelos dela.
Começou então a
surgir o medo de que alguém matasse a onça e acabasse a farra. Já
havia bodegueiro ambulante trafegando pela ribeira em serventia de
cachaça e munição. Um jornalista entrevistador, vindo da Rádio
Piranhas, fez visita ao sítio, com transmissor móvel. A fazenda
Canafístula virou terreiro de festividade, e o fazendeiro, coiteiro
famoso de onça cevada.
Foi então que
certo domingo de caça, Major Apolônio, com medo de que a onça fosse
encontrada, baixou ordem expressa a todos os caçadores: na
Canafístula, ninguém caça mais onça, só histórias de onça caçada.
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