Carlos Gildemar
Pontes
Manifesto poético ao amor doente
Eu gostaria de me desculpar com a
sociedade e com a “Academia”. Peço desculpas por ser poeta e não
corresponder às expectativas e aos padrões racionais que geram a
violência, a corrupção e a subserviência; peço desculpas porque dos
poucos que me cercam, tenho mais amigos do que puxa-sacos e não
posso dar mais afeto a estes do que posso dar aos primeiros; peço
desculpas aos que têm inveja, por não ser invejoso e querer que eles
morram de repente; peço desculpas pelos que morrem de ciúmes, porque
a solidão vai confiná-los na apatia; peço desculpas aos arrogantes,
que arrotam, sob a máscara enferrujada do desespero, a angústia da
solidão; peço desculpas aos estúpidos de pai e mãe, por terem tido
pai e mãe; peço desculpas aos ignorantes que se tornaram burocratas
e aos burocratas que se tornaram ignorantes, e aos que já nasceram
burocratas e ignorantes, porque não serei solidário à estupidez de
convocar reuniões para marcar reuniões, para depois querer em
discussão saber sobre o sexo dos anjos, se anjos nem copular
copulam; peço desculpas aos que não gostam de poesia, de Homero a
Matsuo Basho, de Camões a Baudelaire, de Castro Alves a Haroldo de
Campos, de Augusto dos Anjos aos nossos coetâneos
maxi-e-minimalistas, porque os seguidores de uns e de outros
continuarão a fazer poesia, recebendo o nome de poetas como
expressão de força e também, em muitos casos, como força de
expressão; e quanto a mim, Carlos Gildemar Pontes, diplomado da
poesia neste mundo estupidificado pelas santas guerras do capital
especulativo; poeta e professor, nesta Escola superior inferiorizada
pela mediocridade dos burocratas arquineoliberais de Brasília ao
sertão nordestino; poeta e defensor de uma moratória na ética da
exploração do homem pelo homem, para que não exista a estética do
fomezero na lógica sempre eterna do toma-lá-dá-cá; eu me insurjo
contra esse status quo e promovo o status quorum em nome do bom
senso e dos homens e mulheres de bem que têm esperança no olhar e
partilham o coração como forma de sobrevivência da raça. Não poderia
esquecer o afago existencial das minhas filhas Catarina e Bárbara, a
quem agradeço de coração e mente; aos amigos, poetas e
escrevinhadores em geral, por fim, à minha mãe, pela sua origem
serrana, que trouxe para o litoral onde nasci o cheiro das
florezinhas muçambês e uma coragem de dobrar moinhos e amansar
dragões, onde havia moinhos e dragões, sem medo do fogo ou das
pedras, e de me ensinar com gestos, mais que com palavras, o amor
pela vida que alimentou durante 50 anos.
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